Jurisprudência
27 maio 20 10:42

VENDA DE MATERIAL EXCLUSIVO POR ESCOLA NÃO CONFIGURA VENDA CASADA

APELAÇÃO CÍVELAÇÃO INDENIZATÓRIASENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. MATRÍCULA EM INSTITUIÇÃO DE ENSINO CONDICIONADA À COMPRA DE MATERIAL ESCOLAR PRODUZIDO E VENDIDO DE FORMA EXCLUSIVA PELA ESCOLA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO NÃO CONFIGURADAVENDA CASADA NÃO CARACTERIZADAMANUTENÇÃO DA SENTENÇANEGADO PROVIMENTO AO RECURSO.

1- In casu, sustenta a 1ª autora que se encontrava matriculada na instituição de ensino ré desde o 6º ano do ensino fundamental. Narram que, no final de 2014, a ré deixou de encaminhar a lista de material escolar para o próximo ano letivo, destoando da conduta dos anos anteriores, sob o fundamento de que, a partir do ano de 2015, a escola passaria a utilizar material exclusivo, impresso por seus parceiros. Entendem que ocorreu a prática de venda casada;
2- No caso das instituições de ensino, uma comercialização configura venda casada se o produto estiver disponível para venda em outros comércios e, ainda assim, o pai do aluno for obrigado a comprar o material da própria instituição de ensino. Nesse caso é configurada a venda casada, pois a imposição configura tal ilícito. No entanto, no presente caso, o material escolar utilizado pela ré foi produzido, de forma exclusiva, por esta para seus alunos, em parceria com a Editora Abril. Portanto, não há comercialização do mesmo em outros locais;
3- De acordo com a testemunha arrolada pela própria parte autora, no ato da matrícula não havia a imposição de que o material somente poderia ser adquirido na instituição de ensino, e nem mesmo de que a matrícula somente seria realizada caso o material fosse ali adquirido, tendo sido ofertada a possibilidade de aquisição do material diretamente com a Editora;
4- Outrossim, conforme destacado na sentença recorrida, a parte autora aceitou os termos contratuais, de forma espontânea;
5- Venda casada não configurada;
6- Precedente: 0012203-75.2017.8.19.0007 – APELAÇÃO Des (a). WERSON FRANCO PEREIRA RÊGO – Julgamento: 27/05/2020 – VIGÉSIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL;
7- Negado provimento ao recurso.



Inteiro Teor

Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro

Vigésima Quinta Câmara Cível

Apelação Cível nº 0000103-22.2016.8.19.0202

Apelante: BEATRIZ CAROLINE DE SOUZA SALVI e outro

Apelado: COLÉGIO E CURSO PREPARATÓRIO PRIORIDADE HUM MADUREIRA LTDA

Relator: JDS. DES. ISABELA PESSANHA CHAGAS

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA.

SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.

MATRÍCULA EM INSTITUIÇÃO DE ENSINO

CONDICIONADA À COMPRA DE MATERIAL

ESCOLAR PRODUZIDO E VENDIDO DE

FORMA EXCLUSIVA PELA ESCOLA. FALHA

NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO NÃO

CONFIGURADA. VENDA CASADA NÃO

CARACTERIZADA. MANUTENÇÃO DA

SENTENÇA. NEGADO PROVIMENTO AO

RECURSO.

1- In casu, sustenta a 1ª autora que se encontrava

matriculada na instituição de ensino ré desde o 6º ano do ensino fundamental. Narram que, no final de 2014, a ré deixou de encaminhar a lista de material escolar para o próximo ano letivo, destoando da conduta dos anos anteriores, sob o fundamento de que, a partir do ano de 2015, a escola passaria a utilizar material exclusivo, impresso por seus parceiros. Entendem que ocorreu a prática de venda casada;

2- No caso das instituições de ensino, uma

comercialização configura venda casada se o produto estiver disponível para venda em outros comércios e, ainda assim, o pai do aluno for obrigado a comprar o material da própria instituição de ensino. Nesse caso é configurada a venda casada, pois a imposição configura tal ilícito. No entanto, no presente caso, o material escolar utilizado pela ré foi produzido, de forma exclusiva, por esta para seus alunos, em parceria com a Editora Abril. Portanto, não há comercialização do mesmo em outros locais;

3- De acordo com a testemunha arrolada pela

própria parte autora, no ato da matrícula não havia a imposição de que o material somente poderia ser adquirido na instituição de ensino, e nem mesmo de que a matrícula somente seria realizada caso o material fosse ali adquirido, tendo sido ofertada a possibilidade de aquisição do material diretamente com a Editora;

4- Outrossim, conforme destacado na sentença

recorrida, a parte autora aceitou os termos contratuais, de forma espontânea;

5- Venda casada não configurada;

6- Precedente: 0012203-75.2017.8.19.0007 –

APELAÇÃO Des (a). WERSON FRANCO PEREIRA RÊGO – Julgamento: 27/05/2020 -VIGÉSIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL;

7- Negado provimento ao recurso.

Vistos, discutidos e examinados estes autos, ACORDAM

os Desembargadores da Vigésima Quinta Câmara Cível do Tribunal

de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade de votos,

em negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.

VOTO DO RELATOR

Trata-se de Ação Indenizatória ajuizada por Beatriz Caroline de Souza Salvi e Monica Louizi de Souza Machado em face de Colégio e Curso Preparatório Prioridade Hum Madureira Ltda.

Na forma do § 4º, do artigo 92 do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal, adoto o relatório do juízo sentenciante, assim redigido (index 000220):

“Beatriz Caroline de Souza Salvi representada por sua genitora Monica Louizi de Souza Machado propôs Ação Indenização Por Danos Materiais e Morais em face de Colégio e Curso Preparatório Hum Madureira Ltda, nos termos da petição inicial de fls.03/38, que veio acompanhada dos documentos de fls.39/64.

Citada a parte ré apresentou sua contestação às fls.146/151.

Audiência de conciliação realizada às fls.157, onde restou inviável qualquer possibilidade de acordo entre às partes”

.

O Juízo a quo, na sentença de fls.220/227, julgou a lide nos seguintes termos:

“Isto posto, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO, EXTINGUINDO O PROCESSO, COM RESOLUÇÃO DO

MÉRITO, NA FORMA AUTORIZADA PELO ARTIGO 487, INCISO I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.

Condeno a parte autora, em razão da sucumbência, a arcar com o pagamento das custas processuais, devidas por força de lei, bem como dos honorários advocatícios, aos quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa.

P.R.I”.

Recurso de Apelação da autora (index 000281) no qual afirma que foi vítima da venda casada e que juntaram provas comprovando tal alegação. Requer a reforma da sentença.

É o relatório. Passo ao Voto.

A priori, considerando a tempestividade do presente recurso e o seu devido preparo, recebo o presente recurso de apelação em seus regulares efeitos.

Presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do presente recurso e passo à apreciação das questões meritórias nele suscitada.

A presente ação trata de relação de consumo, enquadrando-se a parte autora e ré, respectivamente, ao conceito de consumidor e prestador de serviços, nos termos dos artigos 2º e 3º, da Lei nº 8078/90 (Código de Defesa do Consumidor).

Acrescente-se que, em decorrência do emprego do Estatuto Consumerista, a responsabilidade civil imputada ao fornecedor de produtos e serviços, é objetiva, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, in verbis:

“Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I – que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.”

In casu, sustenta a 1ª autora que se encontrava matriculada na instituição de ensino ré desde o 6º ano do ensino fundamental. Narram que, no final de 2014, a ré deixou de encaminhar a lista de material escolar para o próximo ano letivo, destoando da conduta dos anos anteriores, sob o fundamento de que, a partir do ano de 2015, a escola passaria a utilizar material exclusivo, impresso por seus parceiros. Entendem que ocorreu a prática de venda casada, eis que o material escolar somente poderia ser obtido nas dependências do réu. Relatam que foram obrigadas a aceitar tal condição para que a 1ª autora permanecesse na escola, tendo renovado a matrícula desta. Afirmam que, no ato da matrícula, foi informado que os alunos iriam acessar conteúdos on-line, e que tal acesso nunca foi disponibilizado. Informam que a nota fiscal referente a compra do material somente foi emitida no final do ano de 2015 e que o material foi entregue com dois meses de atraso. Por fim, sustentam que diversas apostilas não foram utilizadas. Requerem o ressarcimento das despesas com o material escolar e indenização por danos morais.

A Magistrada a quo, em sentença, julgou improcedentes os pedidos, entendendo que não restou caracterizada a venda casada.

Recurso de apelação das autoras no qual sustentam que, apenas após a realização da pré-matrícula e após o pagamento de 3 mensalidades é que foram informadas em relação ao material escolar. Informam que foram

vítimas da venda casada e que a testemunha ouvida em juízo confirmou a conduta da ré.

Entende esta Relatora que a sentença não merece reforma.

A controvérsia a ser analisada restringe-se à alegação da prática da venda casada pela instituição de ensino ré, no que se refere ao material escolar do ano letivo de 2015.

Sustentam as autoras/apelantes que, no final de 2014, a ré encaminhou circular informando que, a partir de 2015, o material do ano letivo seria exclusivo da instituição de ensino e que, apenas após a realização da matrícula e pagamento de três mensalidades, foram informadas que o material em questão somente poderia ser adquirido nas dependências da escola, condicionando a permanência dos estudos na escola à aquisição de tal material.

A definição legal de venda casada é bastante clara: “condicionar o fornecimento de produto ou serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos.” Até mesmo a notícia veiculada pelo portal de notícias do STJ7 arriscou conceito bastante singelo: “Prevista no inciso I do artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), a prática é caracterizada pela presença de duas diferentes formas de condicionamento. Ou por vincular a venda de bem ou serviço a compra de outros itens ou pela imposição de quantidade mínima do produto a ser comprado. ” GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Ob. cit., p. 382.

Como se sabe, o artigo 39 do CDC proíbe a prática de venda casada, nos seguintes termos:

“É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: I – condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos”.

Sobre o tema, ensina o ilustre doutrinador Rizzatto Nunes (Curso de Direito do Consumidor. 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2005, p. 515): “A norma do inciso I proíbe a conhecida “operação casada” ou “venda casada, por meio da qual o fornecedor pretende obrigar o consumidor a adquirir um produto ou serviço apenas pelo fato de ele estar interessado em adquirir outro produto ou serviço. (…) É preciso, no entanto, entender que a operação casada pressupõe a existência de produtos e serviços que são usualmente vendidos separados”.

Na hipótese, assim como concluiu a Magistrada sentenciante, entendo que não restou caracterizada a venda casada.

No caso das instituições de ensino, uma comercialização configura venda casada se o produto estiver disponível para venda em outros comércios e, ainda assim, o pai do aluno for obrigado a comprar o material da própria instituição de ensino. Nesse caso é configurada a venda casada, pois a imposição configura tal ilícito.

No entanto, no presente caso, o material escolar utilizado pela ré foi produzido, de forma exclusiva, por esta para seus alunos, em parceria com a Editora Abril. Portanto, não há comercialização do mesmo em outros locais.

E, de acordo com a testemunha arrolada pela própria parte autora, no ato da matrícula não havia a imposição de que o material somente poderia ser adquirido na instituição de ensino, e nem mesmo de que a matrícula somente seria realizada caso o material fosse ali adquirido, tendo sido ofertada a possibilidade de aquisição do material diretamente com a Editora.

Outrossim, conforme destacado na sentença recorrida, a parte autora aceitou os termos contratuais, de forma espontânea, sendo certo que o material escolhido pela parte ré para o ano letivo fica a critério da própria instituição de ensino (index 000046):

Frise-se que a circular emitida pela ré informa que, em janeiro de 2015, disponibilizaria um stand para vendas e para prestar as devidas informações (index 000045):

Registre-se ainda que, apesar da parte apelante sustentar que apenas tomou ciência de que o material somente poderia ser adquirido juntamente à escola, após a realização da pré-matrícula e pagamento de três mensalidades, tais fatos não estão comprovados nos autos, sendo que, na documentação carreada aos autos não constam as datas dos eventos.

Por fim, destaco que, em que pese a testemunha tenha confirmado a alegação de que o material não foi inteiramente utilizado pela escola ré, a apelante não logrou êxito em comprovar eventual prejuízo sofrido por conta de tal condição.

Por tais razões, entendo que não restou configurada a falha na prestação do serviço alegada, consistente na venda casada, devendo ser mantida a sentença prolatada.

Sobre o narrado, destaco os seguintes Julgados:

Des (a). WERSON FRANCO PEREIRA RÊGO -Julgamento: 27/05/2020 – VIGÉSIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL

DIREITO DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL. ALEGAÇÃO DE PRÁTICA DE VENDA CASADA DE SEGURO DE ROUBO E FURTO QUANDO DA AQUISIÇÃO DE APARELHO CELULAR. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA DE DANOS MATERIAIS E COMPENSATÓRIA POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL INTERPOSTO PELA AUTORA, VISANDO À REFORMA INTEGRAL DO JULGADO. 1) Seguro de Roubo e Furto Qualificado que se constituiu em documento autônomo, fisicamente apartado do contrato de compra e venda do aparelho celular, com informações expressas quanto ao valor e forma de pagamento (fls. 43/46). 2) Ônus de provar eventual vício de consentimento é de quem o alega. As regras e presunções que militam em benefício do consumidor não o eximem de fazer prova do fato constitutivo de seu direito. 3) RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.”

Pelo exposto, VOTO no sentido de conhecer e negar provimento ao recurso de apelação, mantendo-se a sentença. Majoro os honorários advocatícios para 15% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, § 11º do CPC/15.

JDS Isabela Pessanha Chagas

Desembargador Relator

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