Notas Técnicas
15 abr 20 10:29

NOTA TÉCNICA CNDD-FC – 002/2020 – COMITÊ NACIONAL DE DEFESA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO CONSUMIDOR DELIBERAÇÃO CNDD-FC / 15-04-2020

O Comitê Nacional de Defesa dos Direitos do Consumidor, integrado pela Associação Brasileira de Procons (PROCONSBRASIL), Associação Nacional do Ministério Público do Consumidor (MPCON), Colégio Nacional de Defensores Públicos Gerais (CONDEGE), Comissão de Defesa do Consumidor do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor (FNECDC), reunido, em caráter permanente, para avaliar os impactos sanitários, sociais e econômicos causados pelo novo Coronavírus (2019-nCov), à população brasileira,

CONSIDERANDO que a Portaria MS n.º 188, de 03.02.2020, declarou Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN) em decorrência da Infecção Humana pelo novo Coronavírus (2019-nCoV);

CONSIDERANDO a Lei Federal n. º 13.979, de 06 de fevereiro de 2020, publicada no DOU de 07.02.20202, dispondo sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do Coronavírus responsável pelo surto de 2019;

CONSIDERANDO o Estado de Pandemia pelo novo coronavírus (CONVID-19) decretado pela Organização Mundial da Saúde no último dia 11 de março;

CONSIDERANDO as recomendações e determinações restritivas quanto à mobilidade, trânsito e convívio social, no sentido de se evitar o contato físico ou buscar uma maior atenção em ambiente escolar que pressupõe o convívio e partilha de objetos entre alunos, professores e funcionários das unidades de ensino, devendo-se evitar exatamente os ambientes de aglomeração de público, criando ambiente propício ao contágio coletivo com o coronavírus;

CONSIDERANDO assim a SUSPENSÃO DAS AULAS PRESENCIAIS por período que pode vir a ser prorrogado por prazo ainda indeterminado;

CONSIDERANDO o norte de que as relações entre prestadores de serviço e consumidores, no âmbito da educação, deve ser a preservação do ano letivo, mitigando da forma mais eficaz possível os efeitos do isolamento social em que vive o país;

CONSIDERANDO que o art. 6º da Constituição Federal relaciona a educação como direito social do cidadão brasileiro e o art. 206, inciso VII da mesma Carta estipula que é princípio do ensino brasileiro a garantia de padrão de qualidade;

CONSIDERANDO que o direito à educação, assim como os direitos fundamentais à vida e à saúde, encontram resguardo na Constituição Federal de 1988, mais precisamente em seu art. 205, que o impõe como um dever do Estado;

CONSIDERANDO que o ensino pode ser prestado por uma empresa privada, entretanto, por se tratar de serviço de natureza pública, deve obedecer às condições de sua prestabilidade na forma imposta pelo Poder Público, regramento este disposto no art. 209, da Magna Carta;

CONSIDERANDO que o ensino a distância é reconhecido pelo art. 32, § 4º, da Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação), quando utilizado para complementar a aprendizagem ou aplicado em situações emergenciais;

CONSIDERANDO que o Ministério da Educação já publicou a Portaria 343/2020, autorizando a alteração do ensino presencial para à distância, nos cursos superiores, todavia cabe aos Estados da Federação e aos Municípios a regulamentação do ensino médio e fundamental, que estão sob sua gestão;

CONSIDERANDO a edição da Medida Provisória n° 943, de 01 de abril de 2020, que estabelece normas excepcionais sobre o ano letivo da educação básica e do ensino superior decorrentes das medidas para enfrentamento da situação de emergência de saúde pública de que trata a Lei nº 13.979, de 06 de fevereiro de 2020;

CONSIDERANDO que é dever do Estado (poder público) garantir a defesa do consumidor, nos termos do art. 5º, XXXII, da Constituição Federal;

CONSIDERANDO a defesa do consumidor, ao lado de outros, como princípio da ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, cuja finalidade é garantir a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social (CF, art. 170, V);

CONSIDERANDO o princípio da dignidade do consumidor, inserto no art. 4º da Lei nº 8.078/90 – Código de Proteção e Defesa do Consumidor;

CONSIDERANDO o Código do Consumidor, como conjunto de normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social (CF, ADCT, art. 48; Lei nº 8.078/1990, art. 1º);

CONSIDERANDO o atendimento das necessidades dos consumidores, como objetivo geral da Política Nacional das Relações de Consumo (art. 4º, da Lei nº 8.078/90 – Código de Proteção e Defesa do Consumidor);

CONSIDERANDO a proteção da dignidade, da saúde e segurança e dos interesses econômicos dos consumidores, como objetivos específicos da Política Nacional das Relações de Consumo (art. 4º, da Lei nº 8.078/90 – Código de Proteção e Defesa do
Consumidor);

CONSIDERANDO o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor, como um dos princípios da Política Nacional de Relações de Consumo (art. 4º, da Lei nº 8.078/90 – Código de Proteção e Defesa do Consumidor);

CONSIDERANDO a necessidade da harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo, sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores (arts. 4°, I, III e 6º, II e VIII, da Lei nº 8.078/90 – Código de Proteção e Defesa do Consumidor);

CONSIDERANDO o direito básico do consumidor à informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, mormente no tocante ao preço desembolsado, mudanças ou alterações necessárias à viabilidade da prestação do serviço educacional (art. 6º, III, da Lei nº 8.078/90 – Código de Proteção e Defesa do Consumidor);

CONSIDERANDO que o contrato educacional se caracteriza, dentre outros elementos, pelo aspecto fundamental da aplicação didática do processo de ensino e aprendizado para a transmissão de um conhecimento ou técnica – marcadamente pela sua prestação continuada, por período letivo distendido no tempo de seis meses (semestral) ou de um ano (anual);

CONSIDERANDO que é vedado ao fornecedor de produtos e serviços, dentre outras práticas abusivas, prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, ou exigir dele vantagem manifestamente excessiva (art. 39, inciso IV e V, da Lei nº 8.078/90
Código de Proteção e Defesa do Consumidor);

CONSIDERANDO que o artigo 56, do Código de Defesa do Consumidor, determina que as infrações às normas sujeitam o fornecedor a diversas sanções, dentre as quais multa, suspensão temporária da atividade, cassação de licença do estabelecimento ou de atividade e interdição da atividade;

CONSIDERANDO que a responsabilidade social da instituição de ensino pressupõe, caso possua condições materiais de fazê-lo, a manutenção dos empregos, o repasse ao consumidor da redução de custos operacionais e a busca de soluções que permitam ao
consumidor que teve redução ou perda de renda a continuidade dos pagamentos;

CONSIDERANDO que a responsabilidade social do consumidor pressupõe, caso possua condições materiais de fazê-lo, a manutenção dos pagamentos em dia;

CONSIDERANDO o teor das Notas Técnicas n.º 1/2020/GABDPDC/DPDC/SENACON/MJ PROCESSO Nº 08012.000767/2020-63 e n.º
14/2020/CGEMM/DPDC/SENACON/MJ PROCESSO Nº 08012.000728/2020-66, expedidas pela Secretaria Nacional do Consumidor;

A ASSOCIAÇÃO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO CONSUMIDOR – MPCON, a COMISSÃO DAS DEFENSORIAS PÚBLICAS DO CONSUMIDOR JUNTO AO CONDEGE, a COMISSÃO ESPECIAL DE DEFESA DO CONSUMIDOR DO CONSELHO FEDERAL DA OAB, o FÓRUM NACIONAL DAS ENTIDADES CIVIS DE DEFESA DO CONSUMIDOR – FNECDC e a ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PROCONS – PROCONSBRASIL, no uso de suas atribuições, vêm por meio deste manifestarem-se publicamente, visando a orientação de
consumidores e fornecedores, devendo as instituições da rede privada, enquanto perdurar a situação de calamidade, em razão da disseminação do Novo Coronavírus (Sars-Cov2/COVID-19), observar as seguintes diretrizes no tocante à prestação de serviços educacionais, em consonância com as normas de proteção e defesa do consumidor:

1) Manutenção e preservação do contrato Devem ser buscadas todas as formas de conciliar a manutenção do contrato, sem afastar a opção de seu cancelamento. A resolução contratual deve ser a última das alternativas a ser considerada pelas partes.

Na hipótese da real necessidade de se promoverem alterações no contrato – especialmente quanto aos prazos e condições para cumprimento das obrigações financeiras e da prestação do serviço educacional – este deve ser preservado nas suas cláusulas que puderem subsistir, mantendo-se o máximo das características originais da contratação.

2) Da obrigação principal e do dever de informar

2.1) Educação Infantil

Deverão as instituições de ensino:

a) negociar uma compensação futura em decorrência da suspensão das atividades e/ou

b) cumprir o dever de informação, encaminhando a seus alunos/responsáveis planilha de custos referente aos meses já vencidos do ano de 2020, bem como planejamento de custos referente a todo o ano corrente, e também esclarecendo sobre eventual diminuição nos valores referentes à prestação dos serviços educacionais (redução das mensalidades), decorrente da suspensão das aulas presenciais, e aplicando-se desde já o respectivo desconto, considerando-se as peculiaridades intrínsecas à educação infantil.

O consumidor poderá rescindir o contrato sem pagamento de qualquer encargo, especialmente diante de não observação dos itens acima, entretanto deverá ser essa a última alternativa. Neste caso, deverá ser alertado sobre o impacto que os cancelamentos de contrato terão sobre o quantitativo de funcionários diretos e indiretos com quem a instituição de ensino tenha vínculo, demonstrando-se ao contratante em condições de seguir o pagamento sua responsabilidade social em manutenção do contrato.

2.2) Educação Básica (Ensino Fundamental e Médio)

Deverão as instituições de ensino cumprir seu dever de informação nos seguintes termos:

a) encaminhando a seus alunos/responsáveis planilha de custos referente aos meses já vencidos do ano de 2020, bem como planejamento de custos referente a todo o ano corrente;

b) esclarecendo seus alunos/responsáveis sobre eventual diminuição nos valores referentes à prestação dos serviços educacionais (redução das mensalidades), decorrente da suspensão das aulas presenciais;

c) esclarecendo seus alunos/responsáveis sobre eventual realização de aulas presenciais em período posterior, com a consequente modificação do calendário de aulas e de férias, inclusive especificando se estas serão antecipadas;

d) esclarecendo seus alunos/responsáveis sobre eventual prestação das aulas na modalidade à distância, observada a legislação aplicável à espécie, caso em que deverá ser preservada a qualidade do ensino e validada pelos órgãos competentes.

2.3) Ensino Superior

Deverão as instituições de ensino superior cumprir seu dever de informação conforme descrito no item “6” (Educação Básica – Ensino Fundamental e Médio), no que for cabível, atentando-se para os prazos para a prestação dos serviços educacionais, que, neste caso, em regra, são semestrais.

3. Contratos acessórios

Os contratos acessórios, tais como atividades extracurriculares e alimentação cobradas separadamente, deverão ter seu pagamento suspenso enquanto durar a paralisação dos serviços educacionais presenciais. Após retomada, o pagamento deverá ser proporcional aos dias em que o serviço será executado.

4. Canais de atendimento

A instituição de ensino deverá disponibilizar canais de atendimento efetivos que atendam aos contratantes para tratativas de questões administrativas e financeiras e aos alunos para questões pedagógicas.

5. Sanções por inadimplemento

A instituição de ensino deve buscar flexibilizar as sanções contratuais para aqueles que não puderem realizar o pagamento das mensalidades praticados no período, bem como fornecer condições de pagamento posterior sem encargos financeiros.

POR FIM, é importante destacar que devem ser envidados todos os esforços no sentido de se evitar a judicialização das situações ocorridas durante a pandemia. A proteção ao consumidor, as boas práticas do mercado e a política de relacionamento da empresa fornecedora devem servir como parâmetro nas negociações junto ao público consumidor, de modo a que se busquem todas as formas de conciliar a manutenção do contrato.

Trata-se de uma demonstração de maturidade por parte dos fornecedores a adoção de medidas para conter o processo de judicialização, dispensando maior atenção a seu consumidor e, assim, garantindo a redução dos conflitos de consumo, preservando os contratos e fidelizando as relações já estabelecidas.

Diante disso, fica instituído o procedimento para recebimento de solicitações de integrantes do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, consumidores e fornecedores para esclarecimentos e orientações sobre o cumprimento das medidas previstas nesta Nota Técnica, tratando-se de medida que tem por objetivo promover a harmonização dos entendimentos e contribuir com a conciliação e cooperação dos conflitos de consumo.

Brasília/DF, 15 de abril de 2020.
ASSOCIAÇÃO NACIONAL DO MINISTÉRIO
PÚBLICO DO CONSUMIDOR – MPCON
COMISSÃO DAS DEFENSORIAS PÚBLICAS
DO CONSUMIDOR – CONDEGE
COMISSÃO ESPECIAL DE DEFESA DO
CONSUMIDOR DO CONSELHO FEDERAL DA OAB
FÓRUM NACIONAL DAS ENTIDADES
CIVIS DE DEFESA DO CONSUMIDOR – FNECDC
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PROCONS
PROCONSBRASIL

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