Jurisprudência
31 ago 15 10:49

TRIBUNAL MANTÉM PENHORA DE MOBILIÁRIO DE ESCOLA CAPIXABA

A Quarta Turma Especializada do TRF2 decidiu, por unanimidade, reformar a sentença de primeira instância que havia anulado a penhora de bens de uma escola particular da cidade de Vila Velha, região metropolitana de Vitória (ES). Com a decisão, 278 carteiras e 66 cadeiras da Sociedade Educacional de Cobilândia S/C LTDA poderão ser penhoradas a fim de garantir o pagamento de dívida com a Fazenda Nacional referente a não recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) de funcionários do estabelecimento.

Segundo informações do processo, a escola entrou com ação na 2ª Vara Federal de Execução Fiscal de Vitória pedindo a anulação da penhora do mobiliário, alegando que deveria ser aplicado ao caso o artigo 649 do Código de Processo Civil, considerando os móveis como bens essenciais à atividade da empresa.

Acontece que a norma invocada – que dispõe sobre a impenhorabilidade de livros, máquinas, utensílios e instrumentos necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão – é destinada, principalmente à preservação das atividades profissionais de pessoas físicas, e sua aplicação à microempresas, empresas de pequeno porte e firmas individuais até passou a ser admitida, excepcionalmente, na jurisprudência, mas desde que os bens penhorados sejam indispensáveis ao exercício de suas atividades comerciais.

No caso em julgamento, a escola até alegou a impenhorabilidade dos bens, mas não apresentou qualquer prova de que, efetivamente, teve suas atividades inviabilizadas. E, apesar de afirmar ser uma empresa de pequeno porte, também não comprovou tal condição. E mesmo que tivesse comprovado tais condições, segundo o relator do processo no TRF2, o juiz federal convocado José Carlos Garcia, por se tratar de cobrança referente ao FGTS, também não teria alcançado êxito em seu pedido.

“A Quarta Turma Especializada tem entendido que a regra da impenhorabilidade dos bens da empresa de pequeno porte ou microempresa deve ser mitigada, em face do caráter constitucional de que se reveste a verba executada, bem ainda, a sua classificação como direito do trabalhador”, destacou o magistrado em seu voto.

O relator pontuou ainda que a empresa executada poderia oferecer outros bens para penhora, em substituição aos objetos citados na ação, e que, segundo alegações da empresa, seriam indispensáveis às suas atividades. Dessa forma, foi reformada a sentença, com provimento ao recurso de apelação da Fazenda Nacional, mantendo a penhora.

Nº do Processo: 0013465-38.2008.4.02.5001

Fonte: Tribunal Regional Federal da 2ª Região

Publicado em 31 de Agosto de 2015




Nº CNJ          :           0013465-38.2008.4.02.5001

RELATOR     :           JUIZ FEDERAL CONVOCADO JOSÉ CARLOS GARCIA

APELANTE  :           UNIÃO FEDERAL / FAZENDA NACIONAL

APELADO    :           SOCIEDADE EDUCACIONAL DE COBILÂNDIA S/C LTDA

ADVOGADO            :           RODRIGO MARANGOANHA COLODETTE

ORIGEM        :           2ª VARA FEDERAL DE EXECUÇÃO FISCAL DE VITÓRIA/ES (200850010134652)

R E L A T Ó R I O

Cuida-se de remessa necessária, que considero existente, apelação interposta pela UNIÃO/FAZENDA NACIONAL, e recurso adesivo da SOCIEDADE EDUCACIONAL DE COBILÂNDIA S/C LTDA., objetivando a reforma da sentença que julgou parcialmente procedentes os presentes embargos à execução, para anular a penhora que recaiu sobre carteiras escolares, consideradas bens essenciais à atividade da empresa executada (fls. 210-214 e 228-231).

Sustenta a recorrente (fls. 233-239), em síntese, que a embargante não comprovou que os bens penhorados são imprescindíveis à sobrevivência da executada, tão pouco, que se caracteriza como de pequeno porte, micro-empresa ou firma individual. Pugna pela reforma da sentença.

A SOCIEDADE EDUCACIONAL DE COBILÂNDIA S/C LTDA., por sua vez, defende a condenação da embargada na verba sucumbencial, a qual deve ser fixada conforme os parâmetros delineados no art. 20 § 4º do CPC.

Contrarrazões da embargante e da embargada, respectivamente, às fls. 266-278 e 280-283.

O Ministério Público Federal absteve-se de opinar (fls. 286-287).

É o relatório. Peço dia para julgamento.

JOSÉ CARLOS GARCIA

JUIZ FEDERAL CONVOCADO

RELATOR

V O T O

Cuida-se de remessa necessária, que considero existente, apelação interposta pela UNIÃO/FAZENDA NACIONAL, e recurso adesivo da SOCIEDADE EDUCACIONAL DE COBILÂNDIA S/C LTDA., objetivando a reforma da sentença que julgou parcialmente procedentes os presentes embargos à execução, para anular a penhora que recaiu sobre carteiras escolares, consideradas bens essenciais à atividade da empresa executada (fls. 210-214 e 228-231).

A controvérsia que sobressai dos autos cinge-se à aplicação do artigo 649, V do CPC à sociedade por quotas de responsabilidade limitada, que tem por objetivo social a prestação de serviços educacionais.

Pois bem. O art. 649, V do CPC, com redação alterada pela Lei n.º 11.382/2006, dispõe sobre a impenhorabilidade de livros, máquinas, utensílios e instrumentos necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão.

A norma, destinada inicialmente à preservação das atividades profissionais de pessoas físicas, passou a ser admitida, excepcionalmente, na jurisprudência, às microempresas, empresas de pequeno porte e firmas individuais, desde que os bens constritos sejam indispensáveis ao exercício de suas atividades comerciais.

Confira-se:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. IMPENHORABILIDADE DOS BENS DA EXECUTADA. ART. 649, V, DO CPC. EMPRESA DE PEQUENO PORTE. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 07/STJ. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA SEGUIMENTO. DECISÃO […] 2. Ambas as turmas da 1ª Seção desta Corte firmaram entendimento no sentido de que a regra geral é a da penhorabilidade dos bens das pessoas jurídicas, sendo-lhes aplicável apenas excepcionalmente o artigo 649 do CPC, nos casos em que os bens forem indispensáveis à continuidade das suas atividades, desde que se trate de empresa de pequeno porte, microempresa ou firma individual. Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes: RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA. FIRMA INDIVIDUAL. ART.649, VI, DO CPC. DESCABIMENTO. PRECEDENTES. Este colendo Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento segundo o qual “a aplicação do inciso IV do artigo 649 do Código de Processo Civil, a tratar da impenhorabilidade de bens essenciais ao exercício profissional, pode-se estender, excepcionalmente, à pessoa jurídica, desde que de pequeno porte ou micro-empresa ou, ainda, firma individual, e os bens penhorados forem mesmo indispensáveis e imprescindíveis à sobrevivência da própria empresa” (AGREsp 652.489/SC, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ 22.11.2004). Precedentes. Dessarte, na espécie, deve ser mantido o acórdão da Corte de origem, no sentido de que, “confundindo-se entre si os bens da empresa firma individual e o de seu titular, formando um só acervo que se mostra necessário para a consecução de suas tarefas laborais, é de ser reconhecida a impenhorabilidade, nos termos do inc. VI do art. 649 do CPC” (fl. 77). Recurso especial improvido (REsp 681.581/RS, 2ª T., Min. Franciulli Netto, D.J. de 25.04.2005). PROCESSO CIVIL – EXECUÇÃO FISCAL – BENS NECESSÁRIOS AO DESENVOLVIMENTO DA ATIVIDADE DE EMPRESA INDIVIDUAL. 1. Na dicção do art. 649, VI, do CPC, para ser considerado impenhorável um bem, não se faz necessária a sua indispensabilidade no exercício da profissão. A simples utilidade é suficiente para mantê-lo fora da constrição judicial. 2. Jurisprudência do STJ que se posiciona em favor da penhorabilidade dos bens de pessoa jurídica, admitindo, em hipóteses excepcionais, a aplicação do art. 649, VI, do CPC quando se tratar de empresa de pequeno porte, microempresa ou firma individual. 3. Recurso especial improvido (REsp 507.458/RS, 2ª T., Min. Eliana Calmon, D.J. de 11.04.2005) […]. (STJ – REsp: 1088001, Rel.: Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ 14/04/2011).

De outro lado, dispõe o art. 2º da Lei Complementar n.º 139/2011, verbis:

Os arts. 1 o , 3 o , 17, 18, 18-A, 19, 20, 25, 30, 31, 41 e 68 da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, passam a vigorar com as seguintes alterações:

[…]

Art. 3 o Para os efeitos desta Lei Complementar, consideram-se microempresas ou empresas de pequeno porte a sociedade empresária, a sociedade simples, a empresa individual de responsabilidade limitada e o empresário a que se refere o art. 966 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), devidamente registrados no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme o caso, desde que:

I – no caso da microempresa, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais); e

II – no caso da empresa de pequeno porte, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta superior a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais) e igual ou inferior a R$ 3.600.000,00 (três milhões e seiscentos mil reais).

[…]

No caso sob exame, a executada, empresa que exerce atividade na área educacional, sofreu a penhora de  278 (duzentos e setenta e oito) carteiras e 66 (sessenta e seis) cadeiras (fl. 55). Registre-se, por oportuno que a embargante alegou genericamente a impenhorabilidade dos bens, sem, contudo, apresentar qualquer prova de que, efetivamente, teve suas atividades inviabilizadas. Outrossim, apesar de afirmar ser empresa de pequeno porte, também não comprovou tal condição.

Não obstante, tais comprovações seriam irrelevantes in casu, na medida em que esta e. Quarta Turma Especializada tem entendido que, nos casos de cobrança referente ao FGTS, a regra da impenhorabilidade dos bens da empresa de pequeno porte ou microempresa deve ser mitigada, em face do caráter constitucional de que se reveste a verba executada, bem ainda, a sua classificação como direito do trabalhador.

Confira-se, a propósito, o seguinte precedente:

EMBARGOS À EXECUÇÃO. IMPENHORABILIDADE. BEM DE PESSOA JURÍDICA CLASSIFICADA COMO EMPRESA DE PEQUENO PORTE. DÍVIDA DE FGTS. INAPLICABILIDADE. 1-A extensão da impenhorabilidade às empresas de pequeno porte e às microempresas deve ser feita com cautela, sob pena de todas as empresas que se enquadrarem nessa definição furtarem-se ao pagamento do tributo devido. 2-No caso específico, a análise do porte da empresa e a incidência do benefício mostram-se irrelevantes, tendo em vista que a cobrança é referente a FGTS, sendo certo que a regra da impenhorabilidade dos bens da empresa de pequeno porte ou microempresa deve ser mitigada frente à cobrança de dívida dessa natureza, em razão do caráter constitucional da verba e a sua classificação como direito do trabalhador. 3- Apelação provida. (TRF-2, Rel Desembargador Federal LUIZ ANTONIO SOARES, DJe: 17/12/2010, QUARTA TURMA ESPECIALIZADA)

Ademais, a substituição da penhora é direito do devedor, que poderá obtê-la em qualquer fase do processo e independentemente da anuência do credor, nos casos previstos no art. 15, inciso I, da Lei n. 6.830/80. Fora desses casos, o direito à substituição permanece, porém condicionado à concordância da Fazenda Pública. (STJ – REsp: 1377626 RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe 28/06/2013). Desse modo, nada impede que a executada ofereça outros bens em substituição aos que alega ser indispensáveis as suas atividades.

Por fim, considerando que não foi oportunizada a produção de provas, tenho que o processo não se encontra maduro para a análise das demais questões suscitadas na inicial.

Diante do exposto, DOU PROVIMENTO à remessa necessária e ao recurso da União para, reformando a sentença, manter a penhora e determinar o retorno dos autos à origem para  a fim de oportunizar a produção de provas às partes. Prejudicado o recurso adesivo.

É como voto.

JOSÉ CARLOS GARCIA

JUIZ FEDERAL CONVOCADO

RELATOR

E M E N T A

TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA QUE RECAIU SOBRE BENS ESSENCIAIS ÀS ATIVIDADES EMPRESARIAIS. AUSÊNCIA DE PROVAS. DÍVIDA DE FGTS. INAPLICABILIDADE. PREMESSA NECESSÁRIA, COMO EXISTENTE, E APELAÇÃO PROVIDAS. RECURSO ADESIVO PREJUDICADO.

  1. O art. 649, V do CPC, com redação alterada pela Lei n.º 11.382/2006, dispõe sobre a impenhorabilidade de livros, máquinas, utensílios e instrumentos necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão.
  2. A norma, destinada inicialmente à preservação das atividades profissionais de pessoas físicas, passou a ser admitida, excepcionalmente, na jurisprudência, às microempresas, empresas de pequeno porte e firmas individuais, desde que os bens constritos sejam indispensáveis ao exercício de suas atividades comerciais.
  3. A embargante alegou genericamente a impenhorabilidade dos bens, sem, contudo, apresentar qualquer prova de que, efetivamente, teve suas atividades inviabilizadas. Apesar de afirmar ser empresa de pequeno porte, também não comprovou tal condição.
  4. Tais comprovações seriam irrelevantes in casu, na medida em que esta e. Quarta Turma Especializada tem entendido que, nos casos de cobrança referente ao FGTS, a regra da impenhorabilidade dos bens da empresa de pequeno porte ou microempresa deve ser mitigada, em face do caráter constitucional de que se reveste a verba executada, bem ainda, a sua classificação como direito do trabalhador.
  5. A substituição da penhora é direito do devedor, que poderá obtê-la em qualquer fase do processo e independentemente da anuência do credor, nos casos previstos no art. 15, inciso I, da Lei n. 6.830/80. Fora desses casos, o direito à substituição permanece, porém condicionado à concordância da Fazenda Pública. (STJ – REsp: 1377626 RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe 28/06/2013). Desse modo, nada impede que a executada ofereça outros bens em substituição aos que alega ser indispensáveis as suas atividades.
  6. Remessa necessária, como existente, e apelação providas. Recurso adesivo prejudicado.

A C Ó R D Ã O

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, à unanimidade, DAR PROVIMENTO à apelação e à remessa necessária, que se considerou existente, e prejudicado o recurso adesivo, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante do presente julgado.

Rio de Janeiro, 23 de junho de 2015 (data do julgamento)

JOSÉ CARLOS GARCIA

JUIZ FEDERAL CONVOCADO

RELATOR

 

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