Jurisprudência
05 maio 20 19:53

ACP – redução de 30% nas parcelas escolares dos ensinos médio e fundamental e 35% no ensino infantil – AL

Da narrativa fixada na inicial, vê-se que o núcleo sociológico da pretensão toma por base a seguinte ordem de ocorrência: a) que em razão dos impactos causado pela pandemia do novo coronavírus no âmbito dos contratos, a Promotoria de Defesa do Consumidor da Capital, instaurou procedimento preparatório com Recomendação nº 003/2020 direcionada ao Sindicato dos trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino Privado de Alagoas, ao Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Estado de Alagoas, bem como ao Sindicato dos Professores de Alagoas, para tratar sobre a prestação de serviços educacionais durante a pandemia; b) que desde o mês de março os pais dos alunos vêm pugnando pelo reequilíbrio no valor das mensalidades escolares; c) que após diversas tentativas para evitar a judicialização da questão, não se chegou a nenhum consenso entre pais de alunos e sindicato de escolas particulares; d) que as instituições de ensino acataram um dos termos da Recomendação editada pelo Ministério Público, quanto à antecipação das férias escolares, as quais vão ocorrer no mês de maio, no entanto, os meses de março e abril o serviço foi prestado de forma deficiente.”

Finalizou, clamando pela antecipação dos efeitos da tutela, com o fito de determinar a redução no percentual de 30% (trinta por cento) nas mensalidades escolares dos ensinos médio e fundamental a partir do mês de maio de 2020 e de 35% (trinta e cinco por cento) no ensino infantil até que haja liberação pelas autoridades governamentais e sanitárias, para o retorno às aulas presenciais.

De início, importa destacar que a ação civil pública, disciplinada pela Lei n° 7.347/85, pode ser conceituada como “o instrumento judicial adequado à proteção de interesses coletivos e difusos”, (Manual de direito administrativo. 18ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2007. p. 922), os quais encontram sua definição legal art. 81, Parágrafo Único, incisos I a III do Código de Defesa do Consumidor. Confira-se:

Fazendo-se uma exegese dos artigos 300 e 303 do CPC/2015, vê-se que o juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, quando restar evidenciada a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, mediante exposição da lide e do direito que se busca realizar.

Temos, portanto, que para a concessão da tutela de urgência o novo Código de Processo Civil limitou-se a exigir a demonstração da probabilidade do direito perseguido, de modo que, numa análise não exauriente do pleito formulado pelo autor, não se exige a certeza jurídica acerca do direito apontado na inicial, sendo suficiente a aparência desse direito.

Fala ainda o legislador na existência de um “perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”. Neste sentido, temos que tal requisito não se diferencia do anterior pressuposto do dano irreparável ou de difícil reparação, previsto pelo código de 1973.

Por fim, não se pode perder de vista o conteúdo do § 3º do art. 300, vale dizer: o aspecto da irreversibilidade do provimento antecipado, continua ser visto sob dois arcos distintos, ou seja, em face dos interesses do requerente e do requerido, sob pena de em não raras situações tornar o instituto incapaz de produzir o resultado pretendido.

Na hipótese, o pleito antecipatório tem por objeto determinar a redução nas mensalidades escolares de diversas instituições de ensino que prestam serviço de educação infantil, fundamental e médio, como forma de reequilibrar as obrigações durante a vigência das medidas de enfrentamento adotada pelo Poder Público contra a propagação do COVID-19 no Estado de Alagoas.

E, sobre a temática, é por todos sabido que a Organização Mundial de Saúde – OMS em 30 de janeiro de 2020 declarou Situação de Emergência em Saúde Pública de Importância Internacional, sendo que em 11 de março do corrente ano houve o reconhecimento de situação de pandemia pela propagação do novo agente do coronavírus (2019-nCov).

Assim, vejamos em análise específica.

De partida, evidencio que este julgador não está alheio ao grande impacto econômico e social que a pandemia do novo coronavírus provocará na realidade mundial. E em razão disso, estamos vivenciando processos de adaptação e reinvenção na prestação e fornecimento de bens e serviços à sociedade como forma de evitar sua interrupção total. Tanto assim o é, que embora os estabelecimentos comerciais do país não estejam funcionando em sua totalidade, diversos órgãos e pessoas jurídicas privadas adotaram medidas alternativas, garantindo a continuidade da prestação dos serviços bem como o pagamento de seus funcionários.

Nesse contexto, muitas instituições de ensino, como forma de não interromper a prestação de serviços, adotaram o uso de plataformas digitais para transmissão de aulas. Enquanto outras anteciparam o período de férias escolares, postergando a prestação do serviço contratado.

Por relevante, importa destacar que para viabilizar a continuidade dos serviços educacionais, o Ministério da Educação reduziu o ano letivo de modo a permitir que as instituições de ensino possam cumprir o calendário escolar em menos de 200 dias letivos desde que se cumpra a carga horária determinada por lei.

E, nessa linha de entendimento, a Secretaria Nacional de Comunicação publicou “Nota Técnica nº 14/2020”, cujo entendimento este julgador se filia, dispondo que as mensalidades escolares representam “pagamento parcelado, ao longo do semestre ou do ano, usualmente com periodicidade mensal. Essa questão é importante porque o pagamento corresponde a uma prestação de serviço que ocorrerá ao longo do ano. Não faz sentido, nessa lógica, abater das mensalidades uma eventual redução de custo em um momento específico em função da interrupção das aulas, pois elas terão que ser repostas em momento posterior e o custo ocorrerá de qualquer forma” e “ (…) além disso, vale repetir, o fato de as instituições de ensino não estarem arcando com certos custos em função da interrupção das aulas não autoriza a exigência de desconto nas mensalidades, uma vez que as aulas serão repostas em momento posterior e os custos se farão presentes ou serão necessários novos investimentos tecnológicos em função da disponibilização das aulas na modalidade à distância”.

Quanto às instituições que optaram por continuar prestando o serviço através de meios digitais, é de se reconhecer que houve um investimento para implementação de plataformas digitais, devendo, portanto, cada instituição criar canais de atendimento aos seus consumidores, de forma a explicar, de modo transparente, todos os pontos e processos de adaptação na prestação de serviço, que deverá ocorrer de forma eficiente, destacando-se que essa modalidade foi devidamente autorizada pelo Ministério da Educação, sendo portanto uma via a ser adotada pelas instituições de ensino. (evidência nossa)

Pois bem.

Na hipótese, anoto que o Ministério Público ajuizou a presente demanda em face de 150 (cento e cinquenta) instituições de ensino, destacando, ainda, que não demandou em face das instituições de ensino superior também, em razão de suas peculiaridades.

Ora, tal entendimento também deveria ser aplicado às instituições constantes no polo passivo, uma vez que se tratam de pessoas jurídicas com portes econômicos diferentes e modalidades de ensino diversos, como exemplo constam como rés, instituições de ensino na modalidade infantil, fundamental e médio, sem identificar quais as medidas adotadas por cada uma durante o período de pandemia, cuja análise individual é imprescindível para qualquer discussão referente às mensalidades escolares. (sublinhei) Logo, não se mostra razoável a análise do pedido antecipatório de forma indiscriminada, sem a análise individualizada da situação fática de cada entidade de ensino, sob pena de provocar graves prejuízos, na medida que as instituições de ensino particular possuem realidades diferentes, seja no número de alunos, de funcionários ou estrutura. Devendo também ser considerada a diferença na realidade fática de cada consumidor. Sendo, portanto, o melhor caminho a discussão pontual, com prudência e razoabilidade, pautada na boa-fé, entre fornecedor e consumidor. (sublinhei)

E ainda, da análise dos elementos de informação constante nos autos, verifica-se que o percentual de redução pleiteado foi apresentado de forma aleatória, sem qualquer demonstração de adequação e estudo de impacto financeiro nas instituições.

Dessa forma, e sem pretender-se repetitivo, embora este julgador reconheça o grande impacto que a pandemia do COVID-19 gerará no cenário econômico de todos, a sua simples alegação de forma genérica não caracteriza a probabilidade do direito invocado pela parte autora.

É o quanto basta.

Por todo o exposto, ausentes os requisitos previstos no art. 300 do CPC/15, passo a editar os seguintes comandos:

(I) Deixo de conceder o provimento antecipatório alvitrado;

(II) Defiro o pedido de emenda à inicial lançado às fls. 105/106, para tanto, determino ao Sr. Chefe de Secretaria que promova a inclusão das pessoas jurídicas ali individualizadas no polo passivo da presente demanda.

(III) Por fim, remetam-se os autos ao CJUS, para fins de citação do réu e inclusão do feito na pauta de audiências, nos termos do disposto no art. 334 e seguintes, do NCPC.

(IV) Expedientes e comunicações de estilo.

Maceió(AL), 05 de maio de 2020.
Jerônimo Roberto F. dos Santos
Juiz de Direito