JUIZ DESCARTA INDENIZAÇÃO A TRABALHADORA DA REDE DE ENSINO QUE ALEGOU TER SÍNDROME DE ESGOTAMENTO PROFISSIONAL
Inspetora escolar da rede de ensino do município de Poços de Caldas procurou a Justiça do Trabalho pretendendo receber do empregador indenização por danos morais decorrentes de doença profissional e, também, por assédio moral. Disse ter adquirido esgotamento físico e mental característicos da síndrome de burnout, em razão de assédio moral do qual foi vítima no ambiente de trabalho. O caso foi analisado pelo juiz Delane Marcolino Ferreira, titular da 1ª Vara do Trabalho de Poços de Caldas, que não deu razão à trabalhadora.
O magistrado constatou que a inspetora escolar foi acometida de doença profissional que a afastou do trabalho, mas que não lhe causou sequela ou incapacidade definitiva. Além disso, para o juiz, não se pode atribuir ao empregador a culpa pelo esgotamento psíquico da trabalhadora. É que as provas não apontaram para a ocorrência de condutas do empregador direcionadas especificamente contra a autora. Na conclusão do magistrado, na verdade, houve situações ordinárias de trabalho, que podem ter gerado aborrecimentos à inspetora escolar, mas que não podem ser apontadas como causadoras ou mesmo desencadeadoras da doença que a vitimou.
O relato da inspetora
A autora informou que seus problemas tiveram início a partir janeiro de 2017, quando ocorreu a troca do titular da pasta de secretário de Educação do município, com a introdução de uma nova filosofia de trabalho, em que os inspetores escolares deveriam “reciclar suas condutas”. Segundo afirmou, começaram a ocorrer cerceamento de condutas e ações que, até então, eram consideradas normais, passando a ocorrer frequentes conflitos administrativos, atritos comportamentais, estresse e desgaste de relacionamentos interpessoais, inclusive com repercussão negativa na avaliação semestral de desempenho funcional. Fatos que culminaram em “muitas ofensas, agressões e acusações caluniosas, além de muitas humilhações”. Situações
que a levaram ao “desespero emocional”, resultando no afastamento do trabalho e reconhecimento da doença profissional pelo INSS, que lhe conferiu auxílio doença acidentário, por cerca de seis meses.
A trabalhadora finalizou dizendo que não aguentou a pressão no ambiente de trabalho e “sucumbiu à doença”, com quadro de estresse agudo que evoluiu para a “síndrome de burnout” (esgotamento profissional). Na visão da autora, o município, por intermédio da secretária de Educação, a assediou moralmente, o que resultou na doença ocupacional.
Prova pericial
Perícia médica realizada por profissional da confiança do juízo constatou que, de fato, em março/2017, a autora foi diagnosticada por médico psiquiatra com esgotamento físico e mental, característico da síndrome de burnout. Na ocasião, segundo o psiquiatra que a examinou, ela apresentava os sintomas de “irritabilidade, isolamento social e outros sintomas, e fazia uso de medicamento psiquiátrico”.
Conforme apurado pelo perito oficial, após se afastar do serviço por 15 dias e diante da persistência do quadro, a inspetora escolar foi encaminhada à perícia do INSS, que reconheceu o nexo ocupacional e lhe concedeu auxílio-doença até janeiro de 2018. Mas, após receber alta do INSS e retornar às atividades, ela permaneceu em uso de medicações e acompanhamento médico.
Ao realizar a avaliação clínica da autora, o perito oficial registrou que ela se mostrava “revoltada, tensa, aborrecida e estressada” e, ainda, “com choro fácil e desmotivada para o trabalho, por não vislumbrar perspectiva de futuro em sua carreira profissional na Secretaria Municipal de Ensino”. Mas, nas palavras do perito, ela também lhe pareceu “lúcida, bem orientada, mentalmente equilibrada, com raciocínio lógico e coerente, com ordenação correta do pensamento e boa fluidez da conversação, sem qualquer demonstração explícita de estado de esgotamento físico mental, e aspecto clínico de quadro ansioso depressivo.”
De acordo com o perito, embora a autora permanecesse em tratamento médico, a alta médica do INSS seria equivalente “a atestado de capacidade”. Pelo exame clínico da autora e também dos documentos que lhe foram apresentados, o perito concluiu que a patologia se caracteriza como doença do trabalho equiparada a acidente típico, que não gerou incapacidade ou mesmo sequela ocupacional, e que a autora estava apta para retornar ao trabalho.
Ocorre que, logo após o exame pericial, a autora se submeteu a nova avaliação pela Perícia Médica do INSS, a qual reconheceu seu estado de incapacidade para o trabalho, afastando-a por mais três meses. Diante disso, o perito médico prestou esclarecimentos e retificou o laudo para reconhecer que havia “incapacidade temporária para o trabalho”.
Ausência de culpa do empregador na doença da trabalhadora
Como pontuado na sentença, apesar da comprovação do nexo de causalidade entre as atividades profissionais da autora e a doença, não houve sequela definitiva, já que a incapacidade constatada era temporária. Inclusive, ao se manifestar no processo, a própria autora reconheceu que já estava trabalhando antes do afastamento determinado pelo INSS.
Além disso, para o julgador, não houve culpa do empregador pelos problemas de saúde que acometeram a inspetora escolar. Isso porque não se comprovou que o empregador praticou condutas especificamente direcionadas contra ela, capazes de gerar a patologia. Na visão do magistrado, também não houve prova de conduta extraordinária pelo empregador, que tenha contribuído ou sido fator desencadeante para o esgotamento psíquico da trabalhadora.
“A própria reclamante, na entrevista realizada junto ao profissional médico, apontou como fator desencadeante para sua doença a introdução de uma nova filosofia de trabalho, com a reciclagem de condutas pelos profissionais. Apontou, ainda, a verificação de conflitos administrativos, e a ocorrência de reunião para o alinhamento de condutas e práticas administrativas. Ou seja, situações ordinárias de trabalho”, destacou Delane Marcolino Ferreira.
O magistrado ponderou que a existência de discussões, divergências ou mesmo desentendimentos no ambiente de trabalho são situações corriqueiras, o que se caracteriza como “mero aborrecimento”, sendo insuficientes para que se impute culpa ao empregador pela doença da trabalhadora. “É cediço que cada pessoa é única, com sua própria personalidade, e, consequentemente, com a resiliência que lhe é peculiar. O que deve ser observado, nesse caso, é se a conduta do empregador fugiu ao que se deve esperar ordinariamente. No caso concreto apresentado, não vislumbro qualquer conduta do reclamado que pudesse ser caracterizada como tal”, frisou.
Assédio moral inexistente
Em sua análise, o juiz também não verificou a ocorrência de condutas reiteradas direcionadas à inspetora escolar no ambiente de trabalho, de forma a caracterizar o alegado assédio moral. Para ele, toda a narrativa da autora assim como as provas apresentadas denotam que não houve culpa do empregador pela doença da empregada nem assédio moral, de forma a gerar dano na esfera moral a ser indenizado. “Tem-se caracterizado, por outro lado, a ocorrência de fatos rotineiros no ambiente de trabalho, os quais foram desencadeadores da doença da autora, porém sem culpa imputável ao empregador”, concluiu o juiz.
Contribuiu para o entendimento do magistrado o relato de duas testemunhas que participaram da reunião noticiada pela inspetora escolar. É que elas não apontaram qualquer atitude do empregador que pudesse caracterizar dano moral. Por essas razões, o juiz rejeitou o pedido da autora de pagamento de indenização por dano moral pela doença adquirida, bem como pelo alegado assédio moral. A trabalhadora apresentou recurso, que aguarda julgamento no TRT-MG.
Processo: 0011396-47.2017.5.03.0073 — Data de Assinatura: 12/08/2019
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