Jurisprudência
05 maio 16 14:55

INCLUSÃO PESSOA COM DEFICIÊNCIA – LIMINAR DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA PARA DIRIGENTES E PREPOSTOS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
Processo N° 0021010-25.2016.4.01.3800 – 20ª VARA FEDERAL Nº de registro e-CVD 00057.2016.00203800.1.00129/00136

DECISÃO

FEDERAÇÃO DOS ESTABELECIMENTOS DE ENSINO DO ESTADO DE MINAS GERAIS – FENEN/MG, SINDICATO DAS ESCOLAS PARTICULARES DE MINAS GERAIS – SINEP/MG, SINDICATO DOS ESTABELECIMENTOS PARTICULARES DE ENSINO DA REGIÃO SUDESTE DE MINAS GERAIS – SINEPE/SUDESTE, SINDICATO DOS ESTABELECIMENTOS DE ENSINO DO NORDESTE MINEIRO – SINEPE/NE, SINDICATO DAS ESCOLAS PARTICULARES DO TRIÂNGULO MINEIRO – SINEPE/TRIÂNGULO propuseram a presente ação ordinária, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, em face da UNIÃO FEDERAL, objetivando provimento jurisdicional que lhes assegure :

•  Concessão de liminar de tutela provisória de urgência cautelar para que os dirigentes e prepostos dos estabelecimentos de ensino situados nas respectivas bases dos Autores não sofram constrangimento em seu direito de ir e vir, ou mesmo condução coercitiva perante quaisquer autoridades policiais, no curso do processo;

•  Quanto às adaptações razoáveis x ônus desproporcional e indevido, seja declarado que os estabelecimentos de ensino situados nas respectivas bases dos Autores: 1) à míngua de instrumentos para avaliação da deficiência (art. 2º, §§ 1º e 2º, da LBI), podem os estabelecimentos fixar os parâmetros para avaliação da deficiência, conforme incisos I a IV do art. 2º, § 1º, observando-se, ainda, os princípios da plena inclusão expressos na CDPD e LBI; 2) no exame de cada caso concreto estão desobrigados de promover as adaptações de que tratam o art. 3º, VI; 28 e 30 da LBI, sempre que estas se converterem em ônus desproporcional ou indevido, mediante prova a ser feita junto aos interessados e familiares, com cópia e informação ao respectivo sistema de ensino, ao que se vincula a instituição de ensino e que considere, dentre outros fatores, a saúde, a segurança, o custo e finalidade buscada pela medida que se pretende excepcionar via acomodação;

•  Seja declarado, quanto aos custos decorrentes da inclusão: 1) que os estabelecimentos de ensino, por si e seus gestores, não estão obrigados a suportar os custos decorrentes da inclusão de pessoas com deficiência, sob pena de ofensa às garantias constitucionais da livre iniciativa e liberdade de ensino; 2) que seja declarado o direito das instituições particulares, mais especificamente as instituições de ensino superior compreendidas no sistema de ensino da UNIÃO (art. 16, II da Lei 9.394/96), definam um preço de anuidade escolar especificamente às pessoas com deficiência, integrando no quantum o custo do apoio pedagógico especializado, e outro preço de anuidade escolar aos demais consumidores, composto apenas das despesas ordinárias do serviço educacional;

Para tanto, sustentam que as obrigações decorrentes do disposto nos artigos 27 a 30 da Lei n. 13.146/2015 (Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência – LBI) e art. 24 da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, da ONU (CDPD), necessitam de declaração judicial do modo de ser das relações jurídicas obrigacionais desenvolvidas entre os estabelecimentos particulares de ensino e os estudantes com deficiência, considerando-se ainda o disposto nos art. 208, III e 227, § 1º da Constituição da República/88; o art. 3º, VI da LBI e os arts. 58 e 59 da Lei n. 9.394/96 (LDB).

Requerem, enquanto se discute o pleiteado neste processo, medida cautelar provisória para o risco do pedido de prisão ou condução coercitiva de quaisquer dos dirigentes ou prepostos dos estabelecimentos de ensino situados na base territorial dos Autores.

Em síntese, é o relatório. Decido.

Nos termos do novo CPC, a tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental, quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (Parágrafo único do art. 294 e art. 300).

No caso sob análise, verifico estarem presentes os requisitos que autorizam a concessão da medida cautelar requerida.

Dispõe a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI):
Art. 2o Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo
prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com
uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em
igualdade de condições com as demais pessoas.
§ 1o A avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial, realizada por
equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará:
I -os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo;
II -os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais;
III -a limitação no desempenho de atividades; e
IV -a restrição de participação.

Para que o sistema educacional brasileiro se adapte às novas exigências trazidas pela LBI, é necessário aparelhamento e, certamente, regulamentação da norma.

Mais especificamente, no que se refere ao setor educacional privado, sabe-se que, historicamente, encontra-se estruturado para atender a um público universal, coletivizado, indistinto, não possuindo, em regra, aparelhamento capaz de atender a muitas das necessidades especiais demandadas por um público portador de deficiência. Público este que, até o advento da Lei n. 13.146/2015 era absorvido por entidades específicas e especializadas em oferecer a especial formação educacional compatível com a deficiência apresentada.

Por certo que, ante o ineditismo da lei, a grande maioria dos estabelecimentos privados de ensino não se encontra em condições de cumprir, de imediato e em sua inteireza, as exigências postas na LBI, mormente quando ainda não existem parâmetros a nortearem a conduta das referidas instituições de ensino.

Recentemente, na abertura da 12ª Conferência dos Direitos as Pessoas com Deficiência, ocorrida em Brasília em abril de 2016, foi assinado o Decreto sem número, de 27 de abril de 2016, que institui o Comitê do Cadastro Nacional de Inclusão da Pessoa com Deficiência e da Avaliação Unificada da Deficiência. Tal decreto tem por finalidade criar instrumentos para a avaliação biopsicossocial da deficiência e estabelecer diretrizes e procedimentos relativos ao Cadastro-Inclusão.

Esse é um dos passos para viabilizar a entrada em vigor do § 1º do art. 2º da LBI (acima transcrito), que vigerá em até dois anos contados da vigência da LBI, conforme determina o art. 124 da mesma lei.

Portanto, prematuro admitir a incidência imediata do tipo penal previsto no art. 8º da Lei 7.853/1989 (com a redação dada pela LBI), atribuindo-se aos conceitos previstos no inciso I interpretação literal e imediata para fins de configurar a discriminação sancionada – recusar, cobrar valores adicionais, suspender, procrastinar, cancelar ou fazer cessar inscrição de aluno em estabelecimento de ensino de qualquer curso ou grau, público ou privado, em razão de sua deficiência – sem se cuidar de aspectos outros relacionados a cada caso concreto e à aptidão do sistema educacional para absorver pessoas com deficiências diversas antes que ocorra integral regulamentação das disposições da LBI.

Tenho por prematuro atribuir à norma penal do art. 8º, da Lei n. 7.859/89, na redação dada pela Lei n. 13.146/2015, eficácia imediata para sancionar condutas que, sob o aspecto material de sua ocorrência, não se mostra necessariamente típica ao conceito de discriminação penalizado, se as especificidades da identificação do que seja deficiência, para fins da inclusão objetivada pela lei em referência, ainda carecem de melhor definição, sobretudo, caso a caso.

A par destas razões, há outros aspectos a sere avaliados como condicionantes para a tipicidade ensejadora de eventual efeito penal, sobretudo de cunho cautelar. Dentre outros, destaco a responsabilidade pelo ônus a ser assumido em razão da adoção dos meios e da especial formação a ser dispensada à pessoa, quando reconhecidamente portadora de deficiência e das respectivas necessidades de atenção. Aspecto este  que constitui  objeto de litígio nesta ação judicial.

Pelo exposto, suspendo cautelarmente a eficácia da norma contida no art. 8º, I da Lei 7.853/89, para fins de efeitos jurídicos sancionatórios penais, em face dos estabelecimentos substituídos/representados pelas entidades autoras, até que as demais exigências contidas na LBI e questionadas nesta ação sejam devidamente

No pertinente ao pedido de transação, considerando o Ofício n. 0308/2016/GAB/PUMG/PGU/AGU – que informa não possuir a Procuradoria da União base infralegal para entabular acordos de forma sistemática – deixo para apreciá-lo após a manifestação da União, ocasião em que a ré, entendendo cabível a proposta de acordo, deverá informar em preliminar da contestação a necessidade da medida.

Cite-se a União acerca do conteúdo desta decisão e para contestar a ação. Na oportunidade deverá dizer, motivadamente, se e quais provas pretende produzir. O requerimento genérico de prova, sem a devida fundamentação, fica desde logo indeferido.

Apresentada a contestação, caso haja alegação de preliminar, oposição de fato constitutivo ou desconstitutivo do direito ou juntada de documentos (exceto a procuração e cópia de acórdãos, decisões e sentenças), intimem-se os(as) autores(as) para que se manifestem, oportunidade em que deverão dizer, motivadamente, se e quais provas pretendem produzir, ficando indeferido, desde logo, o requerimento genérico, sem a devida fundamentação.
O impulso necessário ao cumprimento deste despacho deverá ser dado pelos próprios servidores.

Publique-se. Registre-se. Intime(m)-se
Belo Horizonte, 5 de maio de 2016.
ITELMAR RAYDAN EVANGELISTA     JUIZ FEDERAL

ADI 5357 – CONTRA LEI 13146/2015 – INCLUSÃO DE TODO E QUALQUER NECESSIDADE ESPECIAL NAS ESCOLAS PARTICULARES

 

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