Jurisprudência
13 abr 15 15:27

TRIBUNAL CONCEDE CERTIFICADO DE CONCLUSÃO DE ENSINO MÉDIO A JOVEM DE 17 ANOS QUE TEVE AULAS EM CASA

 O desembargador federal Jirair Aram Meguerian determinou, liminarmente, que o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Brasília (IFB) e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) emitam o certificado de conclusão do ensino médio a uma aluna de 17 anos que teve aulas em casa em vez de ir para a escola, ora parte autora, para que ela realize sua matrícula em instituição de ensino superior. A decisão reformou sentença de primeiro grau contrária à solicitação.

Ao julgar improcedente o pedido, o Juízo da 16ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal ressaltou que “na hipótese dos autos, a autora atendeu todos os requisitos, exceto o de possuir a idade mínima de 18 anos. O fato de ser emancipada não antecipa a idade biológica da autora, apesar de já possuir declaração pública de seus pais que a mesma já possui condições para reger a sua vida e seus bens”. O magistrado também destacou que a Resolução CNE/CEB nº 3/2010 traz proibição expressa no sentido de que participantes emancipados não podem solicitar a certificação por meio do ENEM.

Inconformada, a demandante recorreu ao TRF1 sustentando que se submeteu ao Exame Nacional do Ensino Médio em 2014 e obteve pontuação suficiente para obtenção do certificado do ensino médio, pedido este que lhe foi negado por contar com apenas 16 anos de idade, embora emancipada. Alegou ter sido aprovada no vestibular sem, contudo, poder matricular-se por não possuir o certificado do ensino médio. Assim, buscou a reforma da sentença.

Para o magistrado, a apelante tem razão em seus argumentos. “Não se mostra razoável impedi-la o acesso ao ensino superior, tendo em vista que foi aprovada no exame vestibular, em face da ausência do certificado de conclusão do ensino, considerando seu desempenho no ENEM”, afirmou.

Ainda de acordo com o desembargador Jirair Aram Meguerian, “ainda que a agravante não tivesse 18 anos quando realizou as provas do ENEM e ainda que não o tenha agora, não me parece razoável negar-lhe o certificado de conclusão do ensino médio, pois esse não deve ser um requisito absoluto, considerando que, se a aluna teve maturidade de apreender o conteúdo programático do ensino médio suficiente para obter nota no exame, o fato de não ter 18 anos me parece irrelevante diante do bem que está sendo almejado: ingressar no ensino superior”.

Com tais fundamentos, deferiu o pedido de antecipação de tutela para determinar a imediata emissão do certificado de conclusão do ensino médio ou declaração equivalente à apelante.




PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO

AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 0006691-40.2015.4.01.0000/DF (d)

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL JIRAIR ARAM MEGUERIAN

AGRAVANTE: LORENA GARCIA ROSA DIAS

DEFENSOR: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO – DPU

AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANISIO TEIXEIRA – INEP

PROCURADOR: ADRIANA MAIA VENTURINI

AGRAVADO: INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE BRASILIA – IFB

PROCURADOR: ADRIANA MAIA VENTURINI

D E C I S Ã O

Trata-se de agravo de instrumento interposto por Lorena Garcia Rosa Dias contra decisão proferida pela MM. Juíza Federal em Auxílio à 16ª Vara, em plantão da Seção Judiciária do Distrito Federal, que indeferiu o pedido de antecipação dos efeitos da tutela formulado nos autos da Ação Ordinária n. 6942-43.2015.4.01.3400, ajuizada contra o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Brasília – IFB, e Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP, objetivando a emissão do certificado de conclusão do ensino médio.

Eis trecho da decisão recorrida no que relevante à controvérsia (fl. 67):

 “Na hipótese dos autos, a autora atendeu todos os requisitos, exceto o de possuir a idade de mínia de 18 anos. O fato de ser emancipada não antecipa a idade  biológica da autora, apesar de  já possuir declaração púbica de seus pais que a mesma já possui condições para reger a sua vida e seus bens. Todavia, isto não a faz adquirir direitos destinados a somente os (sic) maiores de 18 anos, como por exemplo, ingressar num cargo público ou mesmo se candidatar a vereadora de um município, já que o requisito da idade são também exigíveis nestes casos.

Por sua vez, a Resolução CNE/CEB nº 03, de junho de 2010, no parágrafo único do artigo 6º traz a proibição expressa de que participantes emancipados não podem solicitar a certificação por meio do ENEM, o que não deixa pairar dúvidas sobre a impossibilidade do deferimento da tutela antecipada.”

 Irresignada, argumenta a agravante, em apertada síntese, qke se submeteu ao Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) em 2014 e obteve pontuação suficiente para obtenção do certificado do ensino médio, mas esse lhe foi negado em face de contar com apenas 16 anos de idade, embora seja emancipada.

 Alega que foi aprovado no vestibular, mas está impossibilitada de realizar sua matrícula no ensino superior em face de não possuir o certificado do ensino médio, aduzindo que possui conhecimento técnico amplo e maturidade suficiente para cursar o ensino superior.

 Requer o deferimento do pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal para que seja determinado ao IFB a imediata emissão do certificado de conclusão do ensino médio.

 Autos conclusos,  decido.

A princípio, razão parece assistir à agravante, pois não se mostra razoável impedi- la o acesso ao ensino superior, tendo em vista que foi aprovada no exame vestibular (fls. 33/34), em face da ausência do certificado de conclusão do ensino, considerando seu desempenho no Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM/2014, fl. 35.

 Ressalto que, de acordo com a Portaria n. 179/2014 – INEP, que dispõe sobre o processo de  certificação,  as  competências  das  Instituições  Certificadoras  e  do  INEP  e  os requisitos necessários à obtenção de certificado de conclusão do Ensino Médio e declaração parcial de proficiência com a utilização dos resultados de desempenho obtidos no Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM, o aluno poderá requerer a certificação de conclusão do ensino médio, se já contar 18 anos da data de realização das provas do ENEM e atingir o mínimo de 450 pontos em cada uma das áreas de conhecimento do exame e 500 pontos na redação, in verbis;

 Art. 1º O participante do ENEM interessado em obter o certificado de conclusão do Ensino Médio ou a declaração parcial de proficiência deverá atender aos seguintes requisitos:

I – indicar a pretensão de utilizar os resultados de desempenho no exame para  fins  de  certificação  de  conclusão  do  Ensino  Médio,  no  ato  da inscrição, bem como a Instituição Certificadora;

II – possuir no mínimo 18 (dezoito) anos completos na data da primeira prova de cada edição do exame;

III – atingir o mínimo de 450 (quatrocentos e cinquenta) pontos em cada uma das áreas de conhecimento do exame;

IV – atingir o mínimo de 500 (quinhentos) pontos na redação.

 Na hipótese, ainda que a agravante não tivesse 18 anos quando realizou as provas do ENEM e ainda não o tenha agora, não me parece razoável negar-lhe a emissão do certificado de conclusão do ensino médio em face de sua idade, pois esse não deve ser um requisito absoluto, considerando que, se a aluna teve a maturidade de apreender o conteúdo programático do ensino médio suficiente para obter nota no exame ENEM suficiente para emissão do certificado do ensino médio, o fato de não ter 18 anos no momento de realização do exame me parece irrelevante diante do bem que está sendo almejado: ingressar no ensino superior.

 Dessa forma, não obstante o entendimento desta Corte seja no sentido de não ser possível ao aluno menor de 18 anos obter a certificação do ensino médio em face da nota do ENEM (AMS 0006901-06.2012.4.01.3813, MAS 1342-07.2013.4.01.3822), e embora já tenha seguido esse entendimento em julgado na Sexta Turma, a qual componho, curvo-me aos argumentos adotados pelo e. Ministro José Delgado ao relatar o REsp n. 194.782 – ES, que, ao analisar a exigência de requisito de idade mínima para acesso ao ensino supletivo, ponderou ser dever do intérprete não ficar restrito ao sentido literal e abstrato do comando legal, ressaltando que a norma deve ser analisada em face da realidade fática.

 Confira, a propósito, trecho do voto, no que relevante à presente controvérsia:

 “……………………………………………………………………………….. Assim, apesar de se reconhecer a necessidade de uma legislação que normatize o acesso daqueles que, em virtude das vissitudes que lhe foram impostas, não puderam cursar no tempo próprio, os Cursos de 1º e 2º Graus, deve-se tomar o cuidado de evitar ficar restrito ao sentido literal e abstrato do comando legal. É preciso trazê-lo, à realidade por meio da interpretação, e atento ao princípio da razoabilidade, tendo as vistas voltadas para a concretude prática.

………………………………………………………………………………………………………… Transcrevo, por oportuno, trecho do voto-vencido do Des. Moacir Adiers, citado quando do julgamento do REsp n. 189804/RS, do qual fui Relator:

“Por  outro lado, nenhum  de nós desconhece estar ocorrendo na atualidade, provocado por razões das mais variadas ordens, uma antecipação nas faixas etárias, a habilitar o indivíduo ao exercício de certas tarefas e alcançar certos degraus de desenvolvimento intelectual e cultural, inimagináveis até algum tempo atrás. Não discuto se isso é bom ou ruim. Não é este o lugar adequado. Apenas chamo a atenção para uma realidade. Realidade que o Juiz não pode desconsiderar no momento da decisão. Muito embora a legislação preveja a idade mínima de 7 (sete) anos para o ingresso no primeiro grau (art. 19, da Lei n. 53692, de 11.08.1971), sabe-se dar-se o ingresso nele em idade bem anterior, na atualidade; pessoas se formam em curso superior na idade em que, observado o lmite de idade mínima exigida para ingresso no 1. Grau, deveriam estar concluindo o segundo grau, ou há pouco o deveriam tê-lo concluído. Não de advoga o desrespeito á lei. Mas também não se pode deixar de perceber o que se passa no mundo. É preciso conjugar esses dois fenômenos para se obter e dar uma solução justa para o caso concreto, sem que, com isso, também se esteja prestando uma cega adesão ao fato consumado.”

………………………………………………………………………………………………………..”

 Trago ainda o entendimento do MM. Juiz Federal Carlos Eduardo Castro Martins, relator convocado  ao  Gabinete  do  e.  Desembargador  Federal  Souza  Prudente,  ao  julgar  a REOMS 0001169-44.2012.4.01.3813, que ressaltou que a exigência etária para obtenção do certificado do ensino médio aos aprovados no ENEM não deve ser sobrepor aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, como se vê da ementa abaixo:

 ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. CERTIFICADO DE CONCLUSÃO DO ENSINO MÉDIO EM FACE DE APROVAÇÃO  NO  ENEM.  CANDIDATO  MENOR  DE  18  ANOS. PORTARIA MEC Nº 807/2010. INGRESSO EM INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR. POSSIBILIDADE. DIREITO CONSTITUCIONAL À EDUCAÇÃO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. DEFERIMENTO DA LIMINAR. FATO CONSUMADO. SENTENÇA MANTIDA.

I  –  A  questão posta ao  reexame  refere-se  à possibilidade  de reconhecimento dos resultados obtidos por candidato menor de 18 anos nas provas do ENEM para fins de certificação de conclusão do ensino médio, com vistas ao ingresso em instituição de ensino superior para a qual fora aprovado.

II – Não obstante a exigência etária estabelecida pela Portaria nº 807/2010 do Ministério da Educação para aqueles que intencionam obter o aludido certificado com base unicamente em aprovação no ENEM, há de se prestigiar os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade em detrimento de imposições meramente formais.

III – A tutela jurisdicional ora buscada, além de se encontrar respaldada pela noticiada capacidade do impetrante, que alcançou ótimas notas no certame, alinha-se harmoniosamente ao exercício do direito constitucional à educação (CF, art. 205) e à expectativa de futuro retorno intelectual em proveito  da  nação,  que  hão  de  prevalecer  sobre  formalismos eventualmente inibidores e desestimuladores do potencial científico daí decorrente.

IV – Na espécie dos autos, deve-se valorizar o mérito do estudante que, a um ano de concluir o ensino médio, logrou aprovação no ENEM, tornando- se apto a ingressar em duas universidades públicas federais. Entender o contrário  equivaleria  a  impedir  injustamente  a  ascensão  intelectual  do aluno que já possui conhecimento suficiente para se matricular no curso pretendido.

V – Ademais, na hipótese, por força da liminar deferida nos autos, em 16/02/2012,   restaram   asseguradas   ao   impetrante   a   expedição   do certificado almejado e a consequente efetivação da matrícula no curso superior de sua escolha, impondo-se ao caso a aplicação da teoria do fato consumado, haja vista que o decurso do tempo consolidou uma situação fática cuja desconstituição não se mostra razoável.

VI – Remessa oficial desprovida. Sentença confirmada.

(REOMS 0001169-44.2012.4.01.3813 / MG, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, Rel.Conv. JUIZ FEDERAL CARLOS EDUARDO CASTRO MARTINS (CONV.), QUINTA TURMA, e-DJF1 p.625 de 01/03/2013)

 Dessa forma, com estas considerações, ressalto que se a aluno tiver conquistado os requisitos previstos no art. 1º da Portaria n. 179/2014-INEP quanto à pontuação mínima exigida para obtenção do certificado do ensino médio por meio do ENEM, não se mostra razoável lhe negar a emissão do certificado de conclusão do ensino médio e, consequentemente, lhe negar o direito de matricular-se no ensino superior em face da ausência de certificado do ensino médio.

Pelo exposto, defiro, por ora, o pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal e determino a imediata emissão do Certificado de Conclusão do Ensino Médio ou Declaração equivalente de Lorena Garcia Rosa Dias que lhe possibilite a realização de matrícula em Instituição de Ensino Superior.

Comunique-se com urgência ao Juízo a quo. Publique-se.

Intimem-se os agravados facultando-lhes apresentar resposta no prazo legal (art. 527, V, CPC).

Brasília, 26 de fevereiro de 2015.

 

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