Jurisprudência
15 jan 15 11:53

TRF4 ANULA DÍVIDA DA FASE-RS E DETERMINA CONCESSÃO DE IMUNIDADE – REMUNERAÇÃO DE DIRIGENTES (F)

A Fundação de Atendimento Sócio-Educativo do Rio Grande do Sul – Fase-RS – é responsável pela execução das Medidas Sócio-Educativas de Internação e de Semiliberdade, determinadas pelo Poder Judiciário, a adolescentes autores de ato infracional

A 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) deu provimento a recurso da Fundação de Atendimento Socioeducativo do Rio Grande do Sul (Fase) e suspendeu execução fiscal movida contra a entidade pela União. Conforme a decisão, sendo a fundação instituída e mantida pelo Poder Público estadual para promoção de assistência social, fiscalizada pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE), faz jus ao reconhecimento judicial da imunidade de que trata o §7º do art. 195 da Constituição Federal.

A Fase ajuizou ação na Justiça Federal de Porto Alegre após receber notificação de lançamento de dívida fiscal, de cancelamento da condição de entidade filantrópica, bem como de inscrição no CADIN (Cadastro Informativo dos Créditos não Quitados do Setor Público Federal).

A sentença deu parcial provimento ao pedido, apenas assegurando à fundação a obtenção de certidão positiva de débitos com efeito de negativa e a exclusão do CADIN, mantendo, entretanto, a execução. Conforme a decisão, o fato de os diretores da Fase serem remunerados excluiria a entidade do rol das beneficiadas com a Certificação de Entidades Beneficentes de Assistência Social (Cebas), que garante a imunidade tributária.

A fundação recorreu ao tribunal. O relator do acórdão, desembargador federal Rômulo Pizzolatti, reformou a sentença. Para ele, deve ser seguida decisão da 1ª Seção do tribunal a respeito do tema, que estabeleceu a imunidade do §7º do art. 195 da Constituição Federal também para as entidades estatais, dispensando estas dos requisitos típicos das entidades privadas.
Segundo Pizzolatti, a lei estabelece que cargos públicos não podem ser exercidos gratuitamente. “Essa proibição visa à própria proteção do patrimônio público, uma vez que, se é certo que servidores públicos mal remunerados são mais suscetíveis à improbidade administrativa, então a permissão do exercício de cargo público gratuitamente viria propriamente a estimular a corrupção e a improbidade administrativa”, observou Pizzolatti.

 

APELAÇÃO CÍVEL Nº 5032158-65.2010.404.7100/RS

RELATOR: LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH

APELANTE: FUNDAÇÃO DE ATENDIMENTO SÓCIO-EDUCATIVO DO RIO GRANDE DO SUL – FASE : UNIÃO – FAZENDA NACIONAL

APELADO: OS MESMOS

INTERESSADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RELATÓRIO

Trata-se de apelação de sentença que acolheu, em parte, embargos opostos à Execução Fiscal nº 5028950-39.2011.404.7100, apenas para ‘assegurar à FASE a obtenção de certidão positiva de débitos com efeito de negativa e a exclusão do CADIN’, rejeitando os Embargos quanto ao débito executado (correspondente à soma da quantia inscrita nas CDAs 37.221.500-9 e 37.221.501-7 e do encargo legal, que corresponde ao valor de R$ 27.697.466,72). Condenada a embargada (União) nos honorários advocatícios de R$ 15.000,00.

Inconformada, a União sustenta em sua apelação que foi sucumbente minimamente no feito, pois restou mantida integralmente a execução fiscal embargada. Argumenta que ‘não há mais pretensão resistida na medida em que havendo questionamento judicial de ente público por meio de embargos, o entendimento a União é que é devido a expedição de certidão, o mesmo acontecendo em relação ao CADIN, motivo pelo qual não recorre a União desses pontos, não se justificando condenação em honorários nesse ponto também’.

Por sua vez, a embargante repisa em sua apelação os argumentos expendidos na inicial, no sentido da extinção da execução, por força da imunidade a que faz jus (CF/88, art. 195, § 7º). Argumenta que preenche os requisitos do art. 14 do CTN para a fruição da imunidade pretendida. Ainda, sustenta haver excesso de execução, quanto ‘à cobrança do encargo de 20% (vinte por cento) decorrente da aplicação do Decreto nº 1025/69, incluído no crédito em execução’.

Apresentadas contrarrazões, subiram os autos a este Regional.

O feito foi recebido neste gabinete em 06-12-2012 (evento 1).

A pedido da Fundação autora foi adiado o julgamento deste feito (evento 5), o qual seria na pauta de 15-01-2013.

Posteriormente o processo foi suspenso por 90 dias (evento 13) a pedido das partes, para fins de submeter ‘a presente controvérsia à Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Pública Federal – CCAF, vinculada à AGU’.

No evento 21 a Fundação autora requereu nova suspensão do processo, informando que o procedimento conciliatório na Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal assim o exigia.

Através da decisão de evento 23, de 28-10-2013, foi deferida nova suspensão do feito, por 90 dias.

Diante de mais uma manifestação das partes (eventos 40 e 41), deferi a derradeira a suspensão do feito até 01-07-2014 (evento 42).

Esgotado o prazo de suspensão do processo e não tendo as partes apresentando qualquer manifestação ou prestado informação, impõe-se a imediata inclusão do processo em pauta de julgamento.

É o relatório.

VOTO

Julgamento do feito – ausência de comprovação de acordo entre as partes. Conforme relatado, o feito foi inúmeras vezes suspenso, para aguardar as partes efetivarem acordo administrativo, o que não foi comprovado nos autos.

Outrossim, as outras 2 (duas) demandas ajuizadas pela autora (Embargos à Execução nº 5003872-77.2010.404.7100; Mandado de Segurança nº 5004028-60.2013.404.7100/RS) estão sendo levadas a julgamento nesta mesma sessão.

Via de consequência, levo a julgamento também o presente feito.

 Objeto da lide

Controverte-se, em sede de Embargos à execução fiscal, acerca do direito à imunidade tributária prevista no art. 195, § 7º, da CF/88, para fins de afastar os débitos objeto da Execução Fiscal nº 5028950-39.2011.404.7100, relativos à ‘Contribuição da Empresa sobre a Remuneração de Empregados’, ‘Contribuição das Empresas para Financiamento dos Benefícios em Razão da Incapacidade Laborativa’ e ao ‘Encargo Legal de 20%’, do período de 08/2004 a 12/2005, cuja importância representa R$ 27.697.466,72.

Passo, pois, a analisar se a embargante faz jus à imunidade tributária pretendida (art. 195, § 7º, da CF/88).

1) Sobre a evolução histórica da legislação pertinente

O primeiro marco legislativo importante a ser considerado na evolução da matéria é a Lei n.º. 3.577, de 04.07.59. Em seu artigo 1º ela prescreve que:

Art. 1º. Ficam isentas da taxa de contribuição de previdência aos Institutos de Caixas de Aposentadoria e Pensões as entidades de fins filantrópicos reconhecidas como de utilidade pública, cujos membros de suas diretorias não percebam remuneração. – grifo meu.

Destarte, a partir da década de 50, para que a entidade não pagasse a cota patronal era necessário ser filantrópica, com prévio reconhecimento de utilidade pública, além de não remunerar sua diretoria.

Posteriormente, o Decreto-lei 1.572/77 alterou o regime do benefício, revogando a Lei 3.577/59. Em seu artigo 1º dispôs, verbis:

Art. 1º. Fica revogada a Lei n.º 3.577, de 4 de julho de 1959, que isenta da contribuição de previdência devida aos Institutos e Caixas de Aposentadoria e Pensões unificados no Instituto Nacional de Previdência Social – INPS, as entidades de fins filantrópicos reconhecidas de utilidade pública, cujos diretores não percebam remuneração.

  • 1º A revogação a que se refere este artigo não prejudicará a instituição que tenha sido reconhecida como de utilidade pública pelo Governo Federal até à data da publicação deste Decreto-lei, seja portadora de certificado de entidade de fins filantrópicos com validade por prazo indeterminado e esteja isenta daquela contribuição.

Vê-se que às entidades filantrópicas reconhecidas como de utilidade pública federal de acordo com a Lei 3.577/59 e anteriormente à promulgação do Decreto-lei n.º 1.572, de 01/09/77 foi garantido o direito à imunidade tributária e, por conseqüência, ao Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos.

O próximo marco significativo à presente análise histórica-legislativa é a Constituição Federal de 1988.

Em seu artigo 195, § 7º, a Carta Magna assim recepcionou o trato jurídico pretérito:

‘Art. 195 – A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

(.)

  • 7º – São isentas de contribuição para a Seguridade Social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei.’

Em complemento ao comando constitucional, foi posteriormente promulgada a Lei 8.212/91, que em seu artigo 55 assim disciplinou (redação originária):

Art. 55. Fica isenta das contribuições de que tratam os arts. 22 e 23 desta Lei a entidade beneficente de assistência social que atenda aos seguintes requisitos cumulativamente:

I – seja reconhecida como de utilidade pública federal e estadual ou do Distrito Federal ou municipal;

II – seja portadora do Certificado ou do Registro de Entidade de Fins Filantrópicos, fornecido pelo Conselho Nacional de Serviço Social, renovado a cada três anos;

III – promova a assistência social beneficente, inclusive educacional ou de saúde, a menores, idosos, excepcionais ou pessoas carentes;

IV – não percebam seus diretores, conselheiros, sócios, instituidores ou benfeitores, remuneração e não usufruam vantagens ou benefícios a qualquer título;

V – aplique integralmente o eventual resultado operacional na manutenção e desenvolvimento de seus objetivos institucionais, apresentando anualmente ao Conselho Nacional da Seguridade Social relatório circunstanciado de suas atividades.

  • 1º Ressalvados os direitos adquiridos, a isenção de que trata este artigo será requerida ao Instituto Nacional do Seguro Social-INSS, que terá o prazo de 30 (trinta) dias para despachar o pedido.
  • 2º A isenção de que trata este artigo não abrange empresa ou entidade que, tendo personalidade jurídica própria, seja mantida por outra que esteja no exercício da isenção. (Grifei.)

Com fundamento no § 1° do artigo supra mencionado, pretende a autora ver resguardado o seu direito à imunidade, pois dele já gozava sob a égide da Lei n° 3.577/59, antes de sua revogação pelo Decreto-lei n° 1.572/77.

2) Direito adquirido

Muito se discutiu acerca da tese defendida pela embargante, tendo, inclusive, julgado nesse sentido a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça:

MANDADO DE SEGURANÇA. AGRAVO REGIMENTAL. TRIBUTÁRIO. FILANTROPIA. RENOVAÇÃO DE CERTIFICADO DE ENTIDADE BENEFICENTE. LEI n.º 3.577/59. DIREITO ADQUIRIDO.

  1. Entidade filantrópica constituída antes do Decreto-Lei n.º 1.577/77 tem direito à manutenção da imunidade tributária prevista no art. 195, § 7º da Constituição Federal sob a condição de preencher os requisitos estatuídos na lei n.º 3.577 /59.
  2. O art. 55, § 1º, da Lei n.º 8.212/91 ressalva o direito adquirido das entidades previamente constituídas.
  3. O Decreto n.º 752/93 não pode retroagir seus efeitos quanto às entidades supra- referidas.
  4. Constatado o direito à imunidade, há que ser visualizado o direito à renovação do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social – CEBAS.
  5. Segurança concedida. Agravo regimental prejudicado.

(MS n.º 9.220/DF, Rel. Min. Castro Meira, DJU, ed. 07-06-2004)

A deflexão desse posicionamento ocorreu em sessão realizada em 14/02/2007, consagrando a tese de que ‘a declaração de intributabilidade pertinente a relações jurídicas que se sucedem no tempo não ostenta o caráter de imutabilidade e de normatividade de forma a abranger eventos futuros’ (MS 11394/DF, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14.02.2007, DJ 02.04.2007 p. 208).

Firmou-se, então, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, consolidando este novo entendimento. Em recente decisão, tendo como relator o Ministro Teori Albino Zavaski, decidiu aquela corte:

TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. RENOVAÇÃO DO CERTIFICADO DE ENTIDADE BENEFICENTE DE ASSISTÊNCIA SOCIAL – CEBAS. LEGITIMIDADE PASSIVA DO MINISTRO DE ESTADO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. DIREITO ADQUIRIDO. INEXISTÊNCIA.

  1. Trata-se de mandado de segurança contra ato do Ministro de Estado da Previdência Social, consistente no provimento do recurso administrativo de iniciativa do INSS e, via de conseqüência, no cancelamento do certificado expedido a seu favor. Estabelecidos assim o conteúdo do ato atacado e o objeto da impetração, a decisão do mandado de segurança não pode ultrapassar tais limites. Ao postular a própria imunidade tributária, o impetrante requer providência (a) não tratada no ato impugnado e (b) sujeita, no âmbito administrativo, a apreciação de outra autoridade (ou seja, do INSS, autarquia federal com personalidade jurídica própria).
  2. Não há direito adquirido à manutenção de regime fiscal.
  3. Ordem denegada.

(MS 10.510/DF, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24.10.2007, DJ 12.05.2008 p. 1)(Grifei.)

Conclui-se, pois, pela inexistência de direito adquirido à manutenção de regime jurídico.

3) Regime atual

Dito isto, voltemos à Carta Magna e seu artigo 195, § 7º acima citado.

Não obstante o texto legal empregue o termo isenção, é pacífico na doutrina que se trata de imunidade:

‘O art. 195, §7º, da Superlei, numa péssima redação dispõe que são isentas de contribuições para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social. Trata-se, em verdade, de uma imunidade, pois toda restrição ou constrição ou vedação ao poder de tributar das pessoas políticas com habitat constitucional traduz imunidade, nunca isenção, sempre veiculável por lei infraconstitucional.’

(Sacha Calmon Navarro Coelho, Curso de Direito Tributário Brasileiro, 3ª edição, Ed. Forense, 1999, p. 147/148)

Na mesma obra, o citado autor estabelece traços distintivos entre a imunidade e a isenção:

‘A imunidade é uma heterolimitação ao poder de tributar. A vontade que proíbe é a do constituinte. A imunidade habita exclusivamente no edifício constitucional.

A isenção é heterônima quando o legislador de uma ordem de governo com permissão constitucional, proíbe ao legislador de uma ordem de governo o exercício do poder de tributar. A distinção em relação à imunidade, na espécie, é feita a partir da hierarquia normativa. Enquanto a norma imunitória é constitucionalmente qualificada, a norma isencional heterônoma é legalmente qualificada (lei complementar da Constituição). (p. 158 – grifo nosso)

Outrossim, o próprio STF já pacificou o entendimento de que se trata de imunidade:

‘MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. QUOTA PATRONAL. ENTIDADE DE FINS ASSISTENCIAIS, FILANTRÓPICOS E EDUCACIONAIS. IMUNIDADE (CF, ART. 195, § 7º). RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

(…)

A cláusula inscrita no art. 195, §7º, da Carta Política – não obstante referir-se impropriamente à isenção de contribuição para a Seguridade Social – contemplou as entidades beneficentes de assistência social com o favor constitucional da imunidade tributária, desde que por elas preenchidos os requisitos fixados em lei.

A jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal já identificou, na cláusula inscrita no art. 195, §7º, da Constituição da República, a existência de uma típica garantia de imunidade (e não de simples isenção) estabelecida em favor das entidades beneficentes de assistência social. Precedente: RTJ 137/965.(…)’ (STF, 1ª Turma, RMS 22.192-9/DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 19.12.96, unânime – grifei)

Ainda, convém ressaltar que as contribuições sociais na vigência da Constituição Federal de 1988 têm natureza tributária, pois a elas aplicam-se as disposições do artigo 149, da Carta Magna. Neste sentido os dizeres de Antônio Roque Carrazza, quando se refere ao artigo acima citado: Com a só leitura deste artigo, já percebemos que as contribuições em tela têm natureza nitidamente tributária, mesmo porque, com a expressa alusão aos ‘arts. 146, III, e 150, I e III’, ambos da Constituição Federal, fica óbvio que deverão obedecer ao regime jurídico tributário, isto é, aos princípios que informam a tributação, no Brasil. (…) Estamos, portanto, em que estas ‘contribuições’ são verdadeiros tributos (embora qualificados pela finalidade que devem alcançar). Podem, pois, revestir a natureza jurídica de imposto ou taxa, conforme as hipóteses de incidência e bases de cálculo que tiverem. (…) (in Curso de Direito Constitucional Tributário, 16ª ed., Ed. Malheiros, p. 496).

Em complemento ao comando constitucional, foi posteriormente promulgada a Lei 8.212/91, que em seu artigo 55 assim disciplinou (redação originária):

No curso legislativo, sobreveio a Lei 8.742/93 que trata da organização da Assistência Social. Ela criou (art. 17) o Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), órgão superior de deliberação colegiada, vinculado à estrutura do órgão da Administração Pública Federal responsável pela coordenação da Política Nacional de Assistência Social. Em seu artigo 18, III e IV, determinou competir ao CNAS fixar normas para a concessão de registro e certificado de fins filantrópicos às entidades privadas prestadoras de serviços e assessoramento de assistência social, bem como conceder atestado de registro e certificado de entidades de fins filantrópicos, na forma do regulamento a ser fixado.

Para disciplinar administrativamente a concessão do Certificado de Entidades de Fins Filantrópicos, foi editado o Decreto 752/93, que regulamentou a matéria da seguinte forma:

Art. 2° Faz jus ao Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos a entidade beneficente de assistência social que demonstre, cumulativamente:

I – estar legalmente constituída no país e em efetivo funcionamento nos três anos anteriores à solicitação do Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos;

II – estar previamente registrada no Conselho Nacional de Serviço Social, de conformidade com o previsto na Lei n° 1.493, de 13 de dezembro de 1951;

III – aplicar integralmente, no território nacional, suas rendas, recursos e eventual resultado operacional na manutenção e desenvolvimento dos objetivos institucionais;

IV – aplicar anualmente pelo menos vinte por cento da receita bruta proveniente da venda de serviços e de bens não integrantes do ativo imobilizado, bem como das contribuições operacionais, em gratuidade, cujo montante nunca será inferior à isenção de contribuições previdenciárias usufruída;

V – aplicar as subvenções recebidas nas finalidades a que estejam vinculadas;

VI – não remunerar e nem conceder vantagens ou benefícios, por qualquer forma ou título, a seus diretores, conselheiros, sócios, instituidores, benfeitores ou equivalentes;

VII – não distribuir resultados, dividendos, bonificações, participações ou parcela do seu patrimônio, sob nenhuma forma ou pretexto;

VIII – destinar, em caso de dissolução ou extinção da entidade, o eventual patrimônio remanescente a outra congênere, registrada no Conselho Nacional de Serviço Social, ou a uma entidade pública;

IX – não constituir patrimônio de indivíduo(s) ou de sociedade sem caráter beneficente.

1° O Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos somente será fornecido à entidade cuja prestação de serviços gratuitos seja atividade permanente e sem discriminação de qualquer natureza.

2º O Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos terá validade de três anos, permitida sua renovação, sempre por igual período, exceto quando cancelado em virtude de transgressão de norma que originou a concessão.

3° A entidade da área de saúde cujo percentual de atendimentos decorrentes de convênio firmado com o Sistema Único de Saúde (SUS) seja, em média, igual ou superior a sessenta por cento do total realizado nos três últimos exercícios, fica dispensada na observância a que se refere o inciso IV deste artigo (grifos meus)

Após o Decreto 752/93, a concessão ou renovação do Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos [que passou a ser denominado de Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEAS)] passou a obedecer ao disposto no Decreto n.º 2.536/98 e respectivas alterações operadas pelos Decretos n.º 3.504/2000, 3.504/2000, 4.325/2002, 4.381/2002 e 4.499/2002.

Consoante o art. 3º do Decreto 2.536/98, o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social somente poderá ser concedido ou renovado para entidade beneficente de assistência social que demonstre, cumulativamente:

Art. 3º Faz jus ao Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social a entidade beneficente de assistência social que demonstre, cumulativamente:(Redação dada pelo Decreto n.º 4.499, de 4.12.2002)

I – estar legalmente constituída no País e em efetivo funcionamento nos três anos anteriores à solicitação do Certificado;(Redação dada pelo Decreto n.º 4.499, de 4.12.2002)

II – estar previamente inscrita no Conselho Municipal de Assistência Social do município de sua sede se houver, ou no Conselho Estadual de Assistência Social, ou Conselho de Assistência Social do Distrito Federal;

III – estar previamente registrada no CNAS;

IV – aplicar suas rendas, seus recursos e eventual resultado operacional integralmente no território nacional e manutenção e no desenvolvimento de seus objetivos institucionais;

V – aplicar as subvenções e doações recebidas nas finalidades a que estejam vinculadas;

VI – aplicar anualmente, em gratuidade, pelo menos vinte por cento da receita bruta proveniente da venda de serviços, acrescida da receita decorrente de aplicações financeira, de locação de bens, de venda de bens não integrantes do ativo imobilizado e de doações particulares, cujo montante nunca será inferior à isenção de contribuições sociais usufruída;

VII – não distribuir resultados, dividendos, bonificações, participações ou parcelas do seu patrimônio, sob nenhuma forma ou pretexto;

VIII – não perceberem seus diretores, conselheiros, sócios, instituidores, benfeitores ou equivalente remuneração, vantagens ou benefícios, direta ou indiretamente, por qualquer forma ou título, em razão das competências, funções ou atividades que lhes sejam atribuídas pelos respectivos atos constitutivos;

IX – destinar, em seus atos constitutivos, em caso de dissolução ou extinção, o eventual patrimônio remanescente a entidades congêneres registradas no CNAS ou a entidade pública;

X – não constituir patrimônio de indivíduo ou de sociedade sem caráter beneficente de assistência social.

XI – seja declarada de utilidade pública federal. (Inciso incluído pelo Dec. 3.504, de 13.06.2000) – grifo meu.

Para a entidade da área de saúde, os parágrafos de tal artigo disciplinam, especificadamente, o que segue:

  • 1º O Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos somente será fornecido a entidade cuja prestação de serviços gratuitos seja permanente e sem qualquer discriminação de clientela, de acordo com o plano de trabalho de assistência social apresentado e aprovado pelo CNAS.

(…)

  • 4° A instituição de saúde deverá, em substituição ao requisito do inciso VI, ofertar a prestação de todos os seus serviços ao SUS no percentual mínimo de sessenta por cento, e comprovar, anualmente, o mesmo percentual em internações realizadas, medida por paciente-dia. (Redação dada pelo Decreto n.º 5.895, de 18.9.2006)
  • 5º O atendimento no percentual mínimo de que trata o § 4º pode ser individualizado por estabelecimento ou pelo conjunto de estabelecimentos de saúde da instituição.(Redação dada pelo Decreto n.º 4.327, de 8.8.2002)

(…)

  • 8º A instituição de saúde que presta serviços exclusivamente na área ambulatorial, deverá, em substituição ao requisito do inciso VI, comprovar anualmente a prestação destes serviços ao SUS no percentual mínimo de sessenta por cento.(Incluído pelo Decreto n.º 4.327, de 8.8.2002)

(…)

  • 10. Havendo impossibilidade, declarada pelo gestor local do SUS, na contratação dos serviços de saúde da instituição no percentual mínimo estabelecido nos termos do § 4o ou do § 8o, deverá ela comprovar atendimento ao requisito de que trata o inciso VI, da seguinte forma:(Incluído pelo Decreto n.º 4.327, de 8.8.2002)

I – integralmente, se o percentual de atendimento ao SUS for inferior a trinta por cento; (Incluído pelo Decreto n.º 4.327, de 8.8.2002)

II – com cinqüenta por cento de redução no percentual de aplicação em gratuidade, se o percentual de atendimento ao SUS for igual ou superior a trinta por cento; ou (Incluído pelo Decreto n.º 4.327, de 8.8.2002)

III – com setenta e cinco por cento de redução no percentual de aplicação em gratuidade, se o percentual de atendimento ao SUS for igual ou superior a cinqüenta por cento ou se completar o quantitativo das internações hospitalares, medido por paciente-dia, com atendimentos gratuitos devidamente informados por meio de CIH, não financiados pelo SUS ou por qualquer outra fonte.(Incluído pelo Decreto n.º 4.327, de 8.8.2002)

  • 11. Tratando-se de instituição que atue, simultaneamente, nas áreas de saúde e de assistência social ou educacional, deverá ela atender ao disposto no inciso VI, ou ao percentual mínimo de serviços prestados ao SUS pela área de saúde e ao percentual daquele em relação às demais.(Incluído pelo Decreto n.º 4.327, de 8.8.2002)
  • 12. Na hipótese do § 11, não serão consideradas, para efeito de apuração do percentual da receita bruta aplicada em gratuidade, as receitas provenientes dos serviços de saúde.(Incluído pelo Decreto n.º 4.327, de 8.8.2002)
  • 13. O valor aplicado em gratuidade na área de saúde, quando não comprovado por meio de registro contábil específico, será obtido mediante a valoração dos procedimentos realizados com base nas tabelas de pagamentos do SUS.(Incluído pelo Decreto n.º 4.327, de 8.8.2002)
  • 14. Em hipótese alguma será admitida como aplicação em gratuidade a eventual diferença entre os valores pagos pelo SUS e os preços praticados pela entidade ou pelo mercado.(Incluído pelo Decreto n.º 4.327, de 8.8.2002)

(…)

  • 17. A instituição de saúde poderá, alternativamente, para dar cumprimento ao requisito previsto no inciso VI do caput deste artigo ou no § 4o, realizar projetos de apoio ao desenvolvimento institucional do SUS, estabelecendo convênio com a União, por intermédio do Ministério da Saúde, nas seguintes áreas de atuação: (Incluído pelo Decreto n.º 5.895, de 18.9.2006)

I – estudos de avaliação e incorporação de tecnologias;

II – capacitação de recursos humanos;

III – pesquisas de interesse público em saúde;

IV – desenvolvimento de técnicas e operação de gestão em serviços de saúde. – grifo meu.

Adiante no tempo, o último marco legislativo importante ao deslinde da matéria é a Lei n.º 9.732/98, que foi regulamentada pelo Decreto n.º 3.039/99.

Tal diploma alterou o art. 55 da Lei 8.212/91, dando-lhe a seguinte redação:

Art. 55. Fica isenta das contribuições de que tratam os arts. 22 e 23 desta Lei a entidade beneficente de assistência social que atenda aos seguintes requisitos cumulativamente:

I – seja reconhecida como de utilidade pública federal e estadual ou do Distrito Federal ou municipal;

II – seja portadora do Certificado e do Registro de Entidade de Fins Filantrópicos, fornecido pelo Conselho Nacional de Assistência Social, renovado a cada três anos;(Redação dada pela Lei n.º 9.429, de 26.12.1996)

III – promova, gratuitamente e em caráter exclusivo, a assistência social beneficente a pessoas carentes, em especial a crianças, adolescentes, idosos e portadores de deficiência;(Redação dada pela Lei n.º 9.732, de 11.12.98)

IV – não percebam seus diretores, conselheiros, sócios, instituidores ou benfeitores, remuneração e não usufruam vantagens ou benefícios a qualquer título;

V – aplique integralmente o eventual resultado operacional na manutenção e desenvolvimento de seus objetivos institucionais apresentando, anualmente ao órgão do INSS competente, relatório circunstanciado de suas atividades. (Redação dada pela Lei n.º 9.528, de 10.12.97)

  • 1º Ressalvados os direitos adquiridos, a isenção de que trata este artigo será requerida ao Instituto Nacional do Seguro Social-INSS, que terá o prazo de 30 (trinta) dias para despachar o pedido.
  • 2º A isenção de que trata este artigo não abrange empresa ou entidade que, tendo personalidade jurídica própria, seja mantida por outra que esteja no exercício da isenção.
  • 3° Para os fins deste artigo, entende-se por assistência social beneficente a prestação gratuita de benefícios e serviços a quem dela necessitar. (Incluído pela Lei n.º 9.732, de 11.12.98)
  • 4° O Instituto Nacional do Seguro Social – INSS cancelará a isenção se verificado o descumprimento do disposto neste artigo. (Incluído pela Lei n.º 9.732, de 11.12.98)
  • 5º Considera-se também de assistência social beneficente, para os fins deste artigo, a oferta e a efetiva prestação de serviços de pelo menos sessenta por cento ao Sistema Único de Saúde, nos termos do regulamento. (Incluído pela Lei n.º 9.732, de 11.12.98)

A mudança desses requisitos, pretendida pelo art. 1º da Lei nº 9.732/98, foi objeto de controle abstrato de constitucionalidade, já havendo pronunciamento do STF a respeito do assunto.

Com efeito, decidiu o STF no julgamento da medida cautelar na ADI n.º 2.028-5 (Rel. Ministro Moreira Alves, DJU 16.06.2000) por suspender a eficácia do art. 1º da Lei n.º 9.732/98, na parte que alterou a redação do art. 55, III, da Lei n.º 8.212/91 e acrescentou-lhes os §§ 3º, 4º e 5º, bem como dos arts. 4º, 5º e 7º, todos do citado diploma legal.

Dessa forma, é o art. 55 da Lei nº 8.212/91, na sua redação original, que deve ser observado para fruição da imunidade prevista no art. 195, § 7º, da Constituição Federal.

De outro giro, convém registrar que no julgamento da citada ADIn 2028 o Ministro Moreira Alves diferençou, com propriedade, a entidade de assistência social da filantrópica, afirmando, entretanto, que ambas estão abrangidas pela imunidade do art. 195, §7º, da CF. São suas palavras:

Entende a requerente que nem a lei complementar pode restringir o alcance, que decorre da constituição, da imunidade, como sucede no caso, em que esta é dirigida às entidades beneficentes e não às filantrópicas que com aquelas não se confundem como se vê de outros textos constitucionais. Com efeito, o § 1º do art. 199, ao distinguir ‘entidades filantrópicas’ das ‘entidades sem fins lucrativos’ já demonstra que os dois conceitos não se confundem, e, no § 2º, desse mesmo artigo, alude a outro tipo de entidade que é a ‘entidade com fins lucrativos’. Daí resulta que, conforme o tipo de interesse, elas podem perseguir interesse próprio ou interesse de outrem, sendo que perseguem interesse próprio as com fins lucrativos ou as que desempenham atividades circunscritas àqueles que a integram, ao passo que buscam interesses de outrem as que atuam em benefício de outrem que não a própria entidade ou os que a integram, como é o caso das entidades sem fins lucrativos que são beneficentes por visarem a interesse alheio. De outra parte, o modo mais típico de satisfazer interesse próprio é a busca do lucro, e o modo de satisfazer interesse de outrem se faz ou pelo dispêndio patrimonial sem contrapartida, ou pelo atendimento sem oneração direta e excessiva do beneficiado. Assim, entidade que atua em benefício de outrem com dispêndio de seu patrimônio sem contrapartida é entidade filantrópica, mas não deixa de ser beneficente a que, sem ser filantrópica, atua sem fins lucrativos e no interesse de outrem. Por isso, sendo entidade beneficente o gênero, pode-se concluir que toda entidade filantrópica é beneficente, mas nem toda entidade beneficente é filantrópica. Assim, o § 7º do artigo 195 ao utilizar o vocábulo ‘beneficente’ se refere a essas duas espécies (…) – grifo meu.

Indispensável, é certo, que a entidade de assistência social desenvolva atividade voltada aos hipossuficientes, àqueles que, sem prejuízo do próprio sustento e o da família, não possam dirigir-se aos particulares que atuam no ramo buscando lucro, dificultada que está, pela insuficiência de estrutura, a prestação do serviço pelo Estado. Portanto, a cobrança junto àqueles que possuam recursos suficientes não impede que a entidade de assistência social seja reconhecida como beneficente e receba a imunidade constitucional.

Mesmo anteriormente ao citado precedente da Corte Suprema, os doutrinadores já esclareciam qual o sentido da expressão entidade beneficentes:

‘As pessoas imunes, na espécie, são as beneficentes, isto é, as que fazem o bem, a título de assistência social, em sentido amplo, sem animus lucrandi, no sentido de apropriação do lucro.’

(Curso de Direito Tributário Brasileiro, Sacha Calmon Navarro Coelho, 3ª ed., Ed. Forense, 1999, p. 148)

Visto o resumo legislativo sobre a matéria, cabe indagar se, atualmente, a entidade beneficente deve ou não observar os requisitos previstos na Lei 8.742/93 e nos Decretos 752/93 e 2.536/98 (e seus substitutivos), conjuntamente com aqueles previstos na redação original do art. 55 da Lei 8.212/91.

Primeiramente, precisamos entender o que significa ‘estar vigendo a Lei 8.212/91, art. 55, em sua versão originária’.

Significa dizer que a entidade deve, essencialmente, ser portadora do Certificado ou do Registro de Entidade de Fins Filantrópicos, fornecido pelo Conselho Nacional de Serviço Social (posteriormente denominado de Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social – CEAS).

Mas, quais seriam os requisitos para sua concessão?

No julgamento da ADIn 2028, o Pretório Excelso não disciplinou quais seriam eles. Apenas afastou a diferenciação feita pela Lei 9.732/99 – pertinente à oferta e prestação de serviços de pelo menos sessenta por cento ao SUS e ao percentual mínimo de aplicação da receita bruta – enquanto restrição ao conceito de assistência social, o qual teria sido ampliado significativamente pela CF/88. Essa é a melhor interpretação do voto do eminente Min. Moreira Alves. Nesse sentido, é de clareza solar o seguinte trecho em seu voto:

‘De outra parte, no tocante às entidades sem fins lucrativos educacionais e de prestação de serviços de saúde que não pratiquem de forma exclusiva e gratuita atendimento a pessoas carentes, a própria extensão da imunidade foi restringida, pois só gozarão desta ‘na proporção do valor das vagas cedidas integral e gratuitamente a carentes, e do valor do atendimento à saúde de caráter assistencial’, o que implica dizer que a imunidade para o qual a Constituição não estabelece limitação em sua extensão o é por lei.’

Tendo-se tal premissa por certa, a conclusão é de que os requisitos previstos na Lei 8.742/93 e nos Decretos 752/93 e 2.536/98 continuam plenamente exigíveis, quando cumulados com aqueles previstos na redação original do art. 55 da Lei 8.212/91.

Com efeito, esse é o entendimento manifestado recentemente pelo Min. Eros Grau no julgamento do RMS 24065 (ainda em andamento no e. STF), onde se discute a constitucionalidade da Lei 8.742/93 e dos Decretos 752/93 e 2.536/98 quanto ao ponto.

Pugnou o eminente magistrado dever ser afastada a aplicação da liminar proferida na ADI 2028 MC/DF e na ADI 1802 MC/DF, haja vista que nesses precedentes se examina a constitucionalidade de leis que implementam diretamente as imunidades previstas nos artigos 195, § 7º e 150, VI, c, da CF. De outro giro, consignou ser irrelevante, na hipótese, a análise da necessidade ou não de lei complementar para a implementação da imunidade contida no citado art. 195, § 7º, da CF, já que se discute a concessão do certificado e não da imunidade tributária, que é um dos benefícios que pode ser concedido com a certificação. Por fim, registrou que o Decreto 752/93 consubstancia regulamento autorizado pela Lei 8.742/93, fato que legitimaria a exigência do considerado percentual em gratuidade (20% da receita bruta ou 60% dos serviços prestados pelo SUS).

Veja-se o extrato da movimentação processual obtido no Informativo 418 do STF:

Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos e Gratuidade – 1

A Turma iniciou julgamento de recurso ordinário em mandado de segurança no qual instituição beneficente de assistência social pretende, para gozar da imunidade prevista no art. 195, § 7º, da CF, a renovação do seu certificado de entidade de fins filantrópicos, pedido este indeferido pelo Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS, porquanto não comprovada a aplicação anual de, pelo menos, 20% da receita bruta em gratuidade. Alega-se, na espécie, que o Decreto 752/93, ao determinar a aplicação do aludido percentual, possui natureza autônoma, haja vista a inexistência de lei que estabeleça tal obrigatoriedade. Nesse sentido, aduz-se que a imunidade constitui limitação ao poder de tributar e que a expressão ‘em lei’ contida na parte final do citado § 7º, deve ser entendida como lei complementar, em razão do que estabelece o art. 146, II, da CF (‘Art. 146. Cabe à lei complementar: … II – regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;’). Assim, na falta de lei complementar específica disciplinando as condições a serem preenchidas pelas entidades beneficentes, devem incidir apenas os requisitos dispostos nos artigos 9º e 14 do CTN. Sustenta-se, também, ofensa à orientação adotada pelo STF no julgamento da ADI 2028 MC/DF (DJU de 16.6.2000), em que se suspendera a eficácia do art. 55, III, da Lei 8.212/91.

RMS 24065/DF, rel. Min. Eros Grau, 7.3.2006. (RMS-24065)

Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos e Gratuidade – 2

O Min. Eros Grau, relator, negou provimento ao recurso por não vislumbrar ilegalidade a ser sanada. Ressaltando que a concessão do certificado de entidade de fins filantrópicos constitui ato vinculado da Administração, asseverou que, no presente caso, a discussão limita-se ao fundamento de validade da exigência disposta no art. 2º, IV, do Decreto 752/93. Afirmou que essa norma encontra respaldo nos incisos III e IV do art. 18 da Lei 8.742/93 – que trata da organização da assistência social e estabelece que a matéria seja disciplinada em regulamento – e não no inciso II do art. 55 da Lei 8.212/91, que se restringe a listar o certificado entre as condições necessárias à obtenção da imunidade das contribuições sociais. No ponto, afastou a aplicação da liminar na ADI 2028 MC/DF e na ADI 1802 MC/DF (DJU de 13.2.2004), haja vista que nesses precedentes se examina a constitucionalidade de leis que implementam diretamente as imunidades previstas nos artigos 195, § 7º e 150, VI, c, da CF. Afirmou, ainda, ser irrelevante, na hipótese, a análise da necessidade ou não de lei complementar para a implementação da imunidade contida no citado art. 195, § 7º, da CF, já que se discute a concessão do certificado e não da imunidade tributária, que é um dos benefícios que pode ser concedido com a certificação. Por fim, considerando que o Decreto 752/93 consubstancia regulamento autorizado, entendeu que a exigência do percentual em gratuidade fundamenta-se na mencionada Lei 8.742/93, assim como o ato administrativo impugnado. Após, o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Min. Marco Aurélio.

RMS 24065/DF, rel. Min. Eros Grau, 7.3.2006. (RMS-24065)

Registro que o processo (RMS 24065/DF), que originalmente estava sendo julgado pela Primeira Turma, foi afetado ao Plenário do STF, conforme decisão proferida em 03.06.2008, devido à importância da matéria.

Nessa esteira, além dos argumentos bem postos pelo eminente Min. Eros Grau, destaco ainda outros dois para considerar (até eventual confirmação ou entendimento contrário do Plenário do STF) válidas as exigências da Lei 8.742/93 e dos Decretos 752/93, 2.536/98 (e sucessores).

O primeiro diz respeito ao princípio da isonomia. As entidades que se submetem unicamente aos critérios administrativos para concessão do CEAS estão observando tais requisitos. Portanto, seria anti-isonômico tratar aquelas que busquem uma revisão judicial com outros critérios.

Em segundo lugar, porque não cabe ao Poder Judiciário ‘legislar’ sobre o tema, para estabelecer quais os requisitos funcionais bastantes ao conceito de entidade beneficente. De fato, tenho por certo caber ao Poder Judiciário apenas a revisão e o controle do critério administrativo adotado. Nesse sentido, é razoável partir-se dos requisitos exigidos pelos Decretos 752/93 e seus sucessores. Caso contrário, estaríamos diante de um vácuo legislativo, situação maléfica ao contribuinte que teria inviabilizado o exercício da sua imunidade.

4) Sobre os requisitos para concessão da imunidade

A Constituição Federal tem por campo de atuação definir o âmbito de incidência do tributo, o limite dentro do qual o legislador pode atuar para definir as hipóteses nas quais incide.

A imunidade é o obstáculo posto pela Constituição à tributação, pois o que é imune não pode vir a ser tributado. A imunidade impede que a lei defina como hipótese de incidência tributária aquilo que é imune. Trata-se de limitação da competência tributária.

Dessa forma, há que se conjugar a norma acima disposta com aquela prevista no capítulo que trata do Sistema Tributário Nacional e estabelece princípios gerais a serem observados na instituição, regulação e exigibilidade dos tributos. O artigo 146 assim dispõe:

Art. 146. Cabe à lei complementar:

(…)

II – regular as limitações ao poder de tributar; (…)

Portanto, considerando-se que o próprio ordenamento constitucional dispõe sobre a imunidade tributária das entidades assistenciais e beneficentes, existe forte entendimento na doutrina e jurisprudência brasileiras no sentido de que caberia à lei complementar regular esta limitação constitucional (art. 195, §7º, c/c artigo 146, II, ambos da Constituição Federal de 1988).

Vejamos os principais argumentos de tal corrente.

O primeiro é quanto à interpretação do julgado do e.STF na ADI n.º 2028-5.

O Fisco sustenta que o STF, ao apreciar o pedido de liminar na ADI n.º 2028-5, declarou que lei ordinária poderia regular a imunidade/isenção prevista no art. 195, § 7º, da CF, mantendo a vigência do art. 55 da Lei 8212/91, em sua redação original. Todavia, a propalada corrente entende que tal julgado merece melhor exegese.

O Supremo Tribunal Federal, quando da decisão liminar na ADI 2028-5, deixou claro que naquele julgamento havia relevância de ambas as teses apresentadas (necessidade de lei complementar versus uso de lei ordinária), optando, no caso concreto, pela possibilidade de edição de lei ordinária, porquanto, acaso acolhida a tese contrária, restariam incólumes os dispositivos originais da Lei 8.212/91 por não terem sido objeto da ação de inconstitucionalidade. Ou seja, a declaração de inconstitucionalidade do art. 55 da Lei 8212/91 apenas não se deu por deficiência da petição inicial da ADI, que não o atacou. Transcrevo a ementa da decisão no que diz com esse ponto, verbis:

‘De há muito se firmou a jurisprudência desta Corte no sentido de que só é exigível lei complementar quando a Constituição expressamente a ela faz alusão com referência a determinada matéria, o que implica dizer que quando a Carta Magna alude genericamente a ‘lei ‘ para estabelecer princípio e reserva legal, essa expressão compreende tanto a legislação ordinária nas suas diferentes modalidades quanto a legislação complementar.

No caso, o artigo 195, §7º, da Carta Magna, com relação a matéria específica (as exigência a que devem atender as entidades beneficentes de assistência social para gozarem da imunidade aí prevista), determina apenas que essas exigências sejam estabelecidas em lei. Portanto, em face da referida jurisprudência desta Corte, em lei ordinária.

É certo, porém, que há forte corrente doutrinaria que entende que, sendo a imunidade uma limitação constitucional ao poder de tributar, embora o § 7º do artigo 195 só se refira a ‘lei’ sem qualificá-la como complementar – e o mesmo ocorre quanto ao artigo 150, VI, c, da Carta Magna-, essa expressão, ao invés de ser entendida como exceção ao princípio geral que se encontra no artigo 146, II (‘Cabe à lei complementar: … II – regular as limitações constitucionais ao poder de tributar’), deve ser interpretada em conjugação com esse princípio para se exigir lei complementar para o estabelecimento dos requisitos a ser observados pelas entidades em causa.

A essa fundamentação jurídica, em si mesma, não se pode negar relevância, embora, no caso, se acolhida, e, em conseqüência, suspensa provisoriamente a eficácia dos dispositivos impugnados voltará a vigorar a redação originária do artigo 55 da Lei 8.212/91, que, também por ser lei ordinária, não poderia regular essa limitação constitucional ao poder de tributar e que, apesar disso, não foi atacada, subsidiariamente, como inconstitucional nesta ação direta, o que levaria ao não-conhecimento desta para se possibilitar que outra pudesse ser proposta sem essa deficiência.

Em se tratando, porém, de pedido de liminar, e sendo igualmente relevante a tese contrária – a de que, no que diz respeito a requisitos a ser observados por entidades para que posam gozar da imunidade, os dispositivos específicos, ao exigirem apenas lei, constituem exceção ao princípio geral -, não me parece que a primeira, no tocante à relevância, se sobreponha à segunda de tal modo que permita a concessão da liminar que não poderia dar-se por não ter sido atacado também o artigo 55 da Lei 8.212/91 que voltaria a vigorar integralmente em sua redação originária, deficiência essa da inicial que levaria, de pronto, ao não-conhecimento da presente ação direta. (…)

Embora relevante a tese de que, não obstante o §7º do artigo 195 só se refira à ‘lei’, sendo a imunidade uma limitação constitucional ao poder de tributar, é de se exigir lei complementar para o estabelecimento dos requisitos a ser observados pelas entidades em causa, no caso, porém, dada a relevância das duas teses opostas, e sendo certo que, se concedida a liminar, revigorar-se-ia legislação ordinária anterior que não foi atacada, não deve ser concedida a liminar pleiteada.(…)’

(Plenário, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 16.06.2000, unânime – sem grifos no original)

Destarte, afirma a considerada corrente, seria equivocada a forma usual de exegese da ADI 2028-51, isso porque nela foi tomada uma decisão pontual e adaptada às necessidades do caso concreto, isto é, esse julgado deveria ser tido por exceção.

O melhor entendimento do STF sobre a matéria, advoga tal corrente, seria pela necessidade de lei complementar, o que se confirmaria em vários julgados seus, como, por exemplo, o RMS 22.192-9 (1995), o RMS 22.360 (1995) e o MI 232-1/400 (1991).

Ressaltam esses doutrinadores e juristas que o Plenário do STF, por maioria, conheceu, em parte do Mandado de Injunção nº 232, para declarar o estado de mora em que se encontrava (e ainda se encontra) o Congresso Nacional, a fim de que, no prazo de seis meses, adotasse as providências legislativas que se impõem para o cumprimento da obrigação de legislar, decorrente do art. 195, § 7º, da CF/88, sob pena de, vencido esse prazo sem legislar, passasse a requerente a gozar da imunidade requerida. Dois pontos importantes deveriam ser destacados desse julgado. O primeiro é que ele afirma tratar-se de imunidade, como a própria ementa expressa. O segundo é que ele aponta o CTN (recepcionado como lei complementar) como adequado regulamento ao art. 195, § 7º, da CF/88.

Nesse sentido, caberia colacionar importante trecho do voto do Ministro Marco Aurélio:

‘ (…) Peço vênia para, no caso, entender que o mandado de injunção tem um desfecho concreto, não implica simplesmente em uma vitória de Pirro para o Impetrante. O mandado de injunção deve viabilizar o exercício de direito previsto na Carta.

Com isso, concluo pelo acolhimento do pedido e estabeleço os requisitos que poderão vir a ser substituídos por uma outra legislação específica, tomando de empréstimo o que se contém no CTN quanto à imunidade relativa aos tributos e que beneficia as entidades mencionadas no § 7º do artigo 195 da Carta.’.

Ressalta a propalada corrente, entretanto, que, nesse julgamento, o STF não teria aplicado, desde já, o CTN (como norma regulamentadora da imunidade constitucional), por força do seu já conhecido entendimento teórico de não garantir imediata eficácia legislativa ao mandado de injunção, isto é, o Pretório Excelso apenas veiculou notificação de mora ao Congresso Nacional, para, depois de certo tempo e na ausência do provimento legal, disciplinar o regime do caso concreto. Nesse sentido, nota-se que os Ministros Carlos Velloso e Célio Borja acompanharam o voto do Ministro Marco Aurélio, embora a maioria do Pleno tenha votado pela prévia constituição em mora do Congresso Nacional.

Outrossim, seria conveniente afastar a alegação de que o CTN não poderia regular contribuições previdenciárias, porque somente aplicável a impostos. O próprio julgamento do STF no MI 232 respalda o entendimento de que, em se tratando de limitação constitucional ao poder de tributar, a alusão à ‘lei’, contida no art. 195, § 7º, da CF/88, numa interpretação sistemática e teleológica, remeteria à lei complementar (art. 146, II, CF/88).

Afirma o doutrinador Leandro Paulsen, o qual comunga de tal expressiva corrente doutrinária e jurisprudencial, que o art. 14 do CTN regula a imunidade relativa a impostos incidentes sobre o patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, sindicatos, instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos. Entretanto, na ausência de regulação, por lei complementar, da imunidade relativa às contribuições de seguridade social das entidades beneficentes de assistência social prevista no art. 195, §7º, da CF, a doutrina e mesmo os tribunais têm entendido que assume também este papel (in Direito Tributário, 3ª ed., Ed. Livraria do Advogado, p. 477).

Portanto, não haveria concluir que a imunidade constitucional em testilha careceria de eficácia, porquanto não regulamentada na via adequada (haver-se-ia que encarar o art. 55 da Lei 8.212/91 como mera regra tributária isentiva, com exigências próprias, dissociada, pois, da imunidade consagrada no art. 195, § 7º, da Carta Magna), uma vez que a lei complementar exigida pelo art. 195, § 7º, CF/88 não foi, até o presente, editada pelo Congresso Nacional.

Nesse passo, registro que a Egrégia 1ª Seção deste Tribunal (EIAC n° 2000.04.01.097540-8/PR, Rel. Des. Fed. Maria Lúcia Leiria, DJU de 28/5/2003) entendeu que os requisitos à imunidade constitucional só podem ser estabelecidos mediante lei complementar, nos termos do art. 146, II, da Carta Magna. O julgado recebeu a seguinte ementa:

COFINS. IMUNIDADE. ART. 195, § 7º DA CF/88. ART. 14 DO CTN.

  1. Embora o parágrafo 7º do art. 195 da Constituição Federal de 1988 faça referência a isenção, em verdade o benefício corresponde a verdadeira imunidade, o que inclusive já foi reconhecido pelo STF.
  2. Tendo o parágrafo 7º do art. 195 da CF/88 delegado à lei o estabelecimento das exigências para a concessão do benefício, que corresponde a uma imunidade, somente à lei complementar cabe regulá-la, pois este é o instrumento legislativo apto a regular as limitações constitucionais ao poder de tributar, nos termos do artigo 146, II, da Carta de 1988.
  3. Aplicação, na espécie, do artigo 14 do CTN, por ter força de lei complementar.
  4. Vencidos o Desembargador Federal João Surreaux Chagas e o Juiz Federal convocado Joel Ilan Paciornik, que sustentaram entendimento de que a entidade não se enquadra minimamente no conceito de entidade beneficente de assistência social, tal como definido no artigo 55 da Lei 8.212/91, em sua redação anterior à edição da Lei n.º 9.732/98, bem como a necessidade de suscitar incidente de inconstitucionalidade da referida norma.

Na mesma linha de raciocínio, também já julgou esta Turma, consoante o seguinte precedente:

TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. ENTIDADE DE CARÁTER ASSISTENCIAL E FILANTRÓPICO. ART. 195, §7.º DA CF88. LEI COMPLEMENTAR. ART. 14 DO CTN.

  1. Embora a expressão isenção contida no parágrafo 7º do artigo 195 da CF/88, o Supremo Tribunal Federal (no julgamento da ADIn n.º 2.028-5, de 14.07.1999), reconhece que a hipótese é de imunidade. 2. O art. 195, §7.º, da CF/88 ao remeter à lei o estabelecimento das exigências legais para a concessão da imunidade, referiu-se à lei complementar, visto trata-se de limitação ao poder de tributar (art. 146, II CF). 3. O Código Tributário Nacional, mesmo sendo lei ordinária em sua origem, foi recepcionado como lei complementar, sendo aplicável à espécie. 4. Afastada a aplicação dos arts. 1º, 4.º, 5º e 7.º da Lei n. 9.732/98, uma vez que restringem as hipóteses de imunidade estabelecidas pela Constituição. 5. Demonstrados os requisitos do art. 14 do CTN, a entidade assistencial faz jus ao benefício da imunidade previsto no art. 195, §7.º.

(AC N.º 2001.70.08.001839-2/PR, Rel. Des. Fed. Dirceu de Almeida Soares, DJU 11/04/02)

Ambos os julgados colacionados afastaram a necessidade de se suscitar incidente de inconstitucionalidade do art. 55 da Lei n° 8.212/91, diante da suficiência que a matéria encontra no plano constitucional (art. 195, § 7°) e infraconstitucional (art. 14 do CTN), de modo que os preceitos da Lei n° 8.212/91, em especial o art. 55, são totalmente desinfluentes para o delineamento da imunidade em questão.

Todavia, a exigência de lei complementar não é uma interpretação pacífica no Supremo Tribunal Federal, bem como nesta Corte.

A corrente jurisprudencial e doutrinária dominante indica que a Pretório Excelso parece caminhar para uma solução intermediária, que busca harmonizar a aplicação conjunta entre a lei complementar e a lei ordinária. Nesse sentido, a lei complementar seria exigida para dispor sobre a própria imunidade – aspecto material (art. 146, II, da CF), sem embargo de se atribuir à lei ordinária a fixação de normas sobre a constituição e o funcionamento da entidade imune – aspecto formal. Tal corrente eclética ganhou força depois do julgamento de medida cautelar na ADI 1802 MC/DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence (DJ de 13/02/04), cuja ementa é a seguinte:

Ação direta de inconstitucionalidade: Confederação Nacional de Saúde: qualificação reconhecida, uma vez adaptados os seus estatutos ao molde legal das confederações sindicais; pertinência temática concorrente no caso, uma vez que a categoria econômica representada pela autora abrange entidades de fins não lucrativos, pois sua característica não é a ausência de atividade econômica, mas o fato de não destinarem os seus resultados positivos à distribuição de lucros. II. Imunidade tributária (CF, art. 150, VI, c, e 146, II): ‘instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei’: delimitação dos âmbitos da matéria reservada, no ponto, à intermediação da lei complementar e da lei ordinária: análise, a partir daí, dos preceitos impugnados (L. 9.532/97, arts. 12 a 14): cautelar parcialmente deferida.

  1. Conforme precedente no STF (RE 93.770, Muñoz, RTJ 102/304) e na linha da melhor doutrina, o que a Constituição remete à lei ordinária, no tocante à imunidade tributária considerada, é a fixação de normas sobre a constituição e o funcionamento da entidade educacional ou assistencial imune; não, o que diga respeito aos lindes da imunidade, que, quando susceptíveis de disciplina infraconstitucional, ficou reservado à lei complementar.
  2. À luz desse critério distintivo, parece ficarem incólumes à eiva da inconstitucionalidade formal argüida os arts. 12 e §§ 2º (salvo a alínea f) e 3º, assim como o parág. único do art. 13; ao contrário, é densa a plausibilidade da alegação de invalidez dos arts. 12, § 2º, f; 13, caput, e 14 e, finalmente, se afigura chapada a inconstitucionalidade não só formal mas também material do § 1º do art. 12, da lei questionada.
  3. Reserva à decisão definitiva de controvérsias acerca do conceito da entidade de assistência social, para o fim da declaração da imunidade discutida – como as relativas à exigência ou não da gratuidade dos serviços prestados ou à compreensão ou não das instituições beneficentes de clientelas restritas e das organizações de previdência privada: matérias que, embora não suscitadas pela requerente, dizem com a validade do art. 12, caput, da L. 9.532/97 e, por isso, devem ser consideradas na decisão definitiva, mas cuja delibação não é necessária à decisão cautelar da ação direta. – grifo meu.

Como já salientou o eminente Des. Federal Antônio Albino Ramos de Oliveira, em julgado desta Turma (AC N.º 2003.72.02.004007-2/SC, DJU 18/1/2006), embora essa decisão não diga respeito à imunidade do art. 195, § 7º, da CF/88, ela serve de norte à sua compreensão e recomenda que, na análise das lides que lhe são relacionadas, tenham-se em conta não só os parâmetros do art. 14 do CTN como também aqueles do art. 55 da Lei 8.212/91, salvo quando estes estejam desbordando nitidamente dos limites reservados à lei ordinária.

Deve-se concluir, nos termos de tal proposição eclética, que o art. 55 da Lei nº 8.212/91 não contém qualquer outra inconstitucionalidade, a não ser quanto às inovações trazidas pela Lei 9.732/98, cuja eficácia foi suspensa pelo Plenário do STF quando do julgamento da medida cautelar na ADI 2.028, em nov/99, em que foi referendada decisão nesse sentido proferida pelo Min. Marco Aurélio em julho daquele ano. No mais, permanece hígida a exigência do referido dispositivo.

Nesse sentido, é cabal ressaltar que a Corte Especial deste TRF pronunciou-se sobre a matéria, aderindo à corrente intermediária acima exposta. Vejamos o julgado que, por força do regimento interno e por observância ao princípio da economia processual e ao da eficiência da jurisdição, adoto também como razão de decidir:

ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. SEGURIDADE SOCIAL. ENTIDADES BENEFICENTES DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. FRUIÇÃO. REQUISITOS. ARTIGO 55, LEI N.º 8.212/1991, EM SUAS SUCESSIVAS REDAÇÕES. EXCLUSÃO DO OBJETO DA ADI N.º 2.028. CONSTITUCIONALIDADE. REJEIÇÃO DO INCIDENTE.

  1. Incidente de argüição de inconstitucionalidade limitado ao exame da compatibilidade dos artigos 55 da Lei n.º 8.212/91, 5º da Lei n.º 9.429/96, 1º da Lei n.º 9.528/97 e 3º da MP n.º 2.187/01, o primeiro na sua integralidade e os demais nos tópicos em que alteraram a redação daquele, com a Constituição Federal, excetuada a análise das disposições da Lei n.º 9.732/1998 que restaram com a eficácia suspensa por obra do decidido pelo colendo STF em sede liminar na ADI n.º 2.028.
  2. Questionamento acerca da constitucionalidade formal dos preceptivos indicados, que versam sobre os requisitos necessários à fruição do benefício constitucional de dispensa do pagamento de contribuições sociais para a Seguridade Social, contemplado no § 7º do artigo 195 da Constituição Federal em favor das entidades beneficentes de assistência social.
  3. Dispondo o referido § 7º do artigo 195 da Constituição Federal sobre limitação constitucional ao poder de tributar, cumpre a sua regulamentação à lei complementar, nos precisos termos do inciso II do artigo 146 da mesma Constituição.
  4. Confirma essa regra o entendimento que compatibiliza o seu enunciado com a possibilidade de veiculação por lei ordinária das exigências específicas para o alcance às entidades beneficentes de assistência social do benefício de dispensa do pagamento de contribuições sociais para a Seguridade Social, na forma do já mencionado § 7º do artigo 195 da Constituição Federal.
  5. Assim, fica reservado o trato a propósito dos limites do benefício de dispensa constitucional do pagamento do tributo, com a definição do seu objeto material, mediante a edição de lei complementar, pertencendo, de outra parte, à lei ordinária o domínio quanto às normas atinentes à constituição e ao funcionamento das entidades beneficiárias do favor constitucional.
  6. Nessa linha de compreensão, evidenciada na recente jurisprudência de lavra do colendo Supremo Tribunal Federal, não resta outra possibilidade além da rejeição da presente argüição de inconstitucionalidade, na medida em que os preceptivos inquinados de inconstitucionais em verdade rezam sobre os requisitos específicos quanto à constituição e ao funcionamento das entidades beneficentes de assistência social, à vista da pretensão ao deferimento do benefício tributário em liça.
  7. Incidente de argüição de inconstitucionalidade rejeitado.

(INCIDENTE DE ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE NA AC N.º 2002.71.00.005645-6/RS, Rel. Des. Federal DIRCEU DE ALMEIDA SOARES, Rel. para acórdão Desª. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER, D.E. Publicado em 29/03/2007) – grifos meus.

Dados tais contornos e ainda tomando-se por base a adotada corrente intermediária, é possível concluir-se, por igual, que a necessidade de obtenção e renovação dos certificados de entidade de fins filantrópicos é requisito formal para a constituição e funcionamento das entidades e, portanto, constitui matéria que pode ser tratada por lei ordinária. Nesse sentido, precisas são as palavras do eminente Juiz Federal Leandro Paulsen ao relatar o julgamento, nesta Turma (20/06/06), dos Embargos de Declaração na AC n.º 2001.71.00.002082-2/RS, in verbis:

 (…) Todavia, no sentido de conciliar a exigência de lei complementar para a regulamentação de limitações ao poder de tributar, constante do art. 146, II, da CF, com a referência simplesmente aos requisitos de lei no art. 195, § 7º, da CF e tendo em conta a rígida posição do STF no sentido de que, quando a Constituição refere lei, cuida-se de lei ordinária, pois a lei complementar é sempre requerida expressamente, decidiu, o STF, em junho de 2005, no Ag. Reg. n.º RE 428.815-0, de modo inequívoco, que as condições materiais para o gozo da imunidade são matéria reservada à lei complementar, mas que os requisitos formais para a constituição e funcionamento das entidades, como a necessidade de obtenção e renovação dos certificados de entidade de fins filantrópicos, são matéria que pode ser tratada por lei ordinária. Na ADI 2.028/DF, tal posição já havia sido invocada, refletindo entendimento iniciado pelo Ministro Soares Munhoz em 1981, relativamente à imunidade a impostos, à luz da Constituição de 1967 com a redação da EC n.º 1/69.

Diz a ementa:

‘Imunidade tributária: entidade filantrópica: CF, arts. 146, II e 195, § 7º: delimitação dos âmbitos da matéria reservada, no ponto, à intermediação da lei complementar e da lei ordinária (ADI-MC 1802, 27.8.1998, Pertence, DJ 13.2.2004; RE 93.770, 17.3.81, Soares Muñoz, RTJ 102/304). A Constituição reduz a reserva de lei complementar da regra constitucional ao que diga respeito ‘aos lindes da imunidade’, à demarcação do objeto material da vedação constitucional de tributar; mas remete à lei ordinária ‘as normas sobre a constituição e o funcionamento da entidade educacional ou assistencial imune’. [grifei].’

(STF, 1ª T., unân., AgRRE 428.815-0/AM, rel. Min. Sepúlveda Pertence, jun/05) – grifos meus.

Com efeito, o art. 55 da Lei 8.212/91, com suas redações posteriores, inclusive a da MP 2.187/01, exige, para a caracterização como entidade imune, o reconhecimento como de utilidade pública federal e estadual ou do Distrito Federal ou municipal (inciso I), a ostentação de Registro e do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social, fornecidos pelo Conselho Nacional de Assistência Social, renovado a cada três anos (inciso II) e a apresentação anual ao órgão do INSS competente de relatório circunstanciado de suas atividades (inciso V). Veja-se, todas essas exigências constituem requisitos formais para o funcionamento da entidade enquanto entidade beneficente de assistência social, ensejando a verificação do cumprimento das condições materiais para o enquadramento dentre as entidades beneficiadas pela imunidade do art. 195, § 7º, da CF. Cuida-se, pois, de matéria passível de ser tratada por lei ordinária, constituindo, assim, exigências validamente estabelecidas.

Recentemente sumulou o e. Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria:

Súmula n° 352 – STJ. A obtenção ou a renovação do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (Cebas) não exime a entidade do cumprimento dos requisitos legais supervenientes. Rel. Min. Luiz Fux, em 11/06/2008.

5) Caso dos autos

O caso em tela comporta uma peculiaridade, vez que a Embargante é uma fundação criada e mantida pelo Poder Público estadual e destinada ao desempenho de atividades do Estado do Rio Grande do Sul na ordem social.

A execução fiscal foi ajuizada contra a Fundação de Atendimento Sócio-Educativo do Rio Grande do Sul – FASE, relativamente à ‘Contribuição da Empresa sobre a Remuneração de Empregados’, à ‘Contribuição das Empresas para Financiamento dos Benefícios em Razão da Incapacidade Laborativa’ e ao ‘Encargo Legal de 20%’, do período de 08/2004 a 12/2005, no montante de R$ 27.697.466,72.

Em 17/01/1969, foi criada a Fundação Estadual do Bem-Estar – FEBEM que tinha por objetivos:

Art. 4º – A Fundação terá por finalidade:

I – conjugar os esforços do Poder Público e da comunidade para solução do problema do menor que por suas condições sócio-econômicas não tem acesso aos meios normais de desenvolvimento;

II – realizar estudos e pesquisas, tendo em vista o desempenho da missão que lhe cabe, promovendo cursos, seminários e congressos, bem como o levantamento atualizado do problema do menor em todo o território estadual;

IIII – promover a articulação entre as entidades públicas de desenvolvimento e organização de comunidades e as particulares do bem-estar do menor, para a formulação, coordenação ou execução de programas e serviços referentes ao menor, em termos de planos integrados;

IV – propiciar a formação, o treinamento e o aperfeiçoamento do pessoal técnico e auxiliar, remunerado ou voluntário, indispensável à consecução de seus objetivos;

V – conceder auxílios e subvenções a entidades particulares registradas no órgão;

VI – prestar assistência técnica aos municípios e às entidades que adotarem a Política do Bem-Estar do Menor;

VII – mobilizar a opinião pública no sentido da indispensável participação de toda a comunidade para solucionar o problema da infância desvalida;

VIII – colaborar em programas de desenvolvimento da comunidade, tendo em vista, principalmente, o fortalecimento da família e a intensificação dos trabalhos de natureza corretiva, preventiva ou promocional, que visem ao bem-estar do menor;

IX – celebrar convênio, acordos e contratos com entidades públicas ou particulares que objetivem o bem-estar do menor.

Parágrafo único – A Fundação dará execução às sentenças da Justiça de Menores.

Em 28/5/2002, a Lei n° 11.800, de 28/05/2002 alterou a Lei n° 5.747/69, promovendo a cisão da FEBEM e autorizando o Poder Executivo a criar a Fundação de Atendimento Sócio-Educativo do Rio Grande do Sul – FASE, pessoa jurídica de direito privado, responsável pela execução do programa estadual de medidas sócio-educativas de internação e semiliberdade:

Art. 1º – Fica o Poder Executivo autorizado a criar a Fundação de Atendimento Sócio-Educativo do Rio Grande do Sul, pessoa jurídica de direito privado vinculada à Secretaria do Trabalho, Cidadania e Assistência Social, com autonomia administrativa e financeira, que reger-se-á por esta Lei e estatuto social próprio, mantida pelo Poder Público, segundo os princípios estabelecidos na Constituição Federal, de 5 de outubro de 1988, e em conformidade com o disposto na Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, – Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA.

Art. 2º – A Fundação de Atendimento Sócio-Educativo do Rio Grande do Sul terá por finalidade a implementação e a manutenção do sistema de atendimento responsável pela execução do programa estadual de medidas sócio-educativas de internação e semiliberdade, efetivando as obrigações previstas na legislação vigente quanto às unidades de atendimento.

Parágrafo único – A Fundação deverá apresentar anualmente plano de trabalho e relatório de atividades ao Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente – CEDICA.

Art. 3º – À Fundação compete administrar a execução de medidas sócio-educativas de internação e semiliberdade, previstas em lei federal, destinadas a adolescentes autores de ato infracional encaminhados pela autoridade judiciária competente.

Ainda que intituladas como de direito privado, tanto a FEBEM quanto a FASE foram criadas sob regime jurídico público e voltadas à execução de ação da Administração Pública, sendo mantidas pelo Poder Público.

Considerando o caráter público da Fundação, não há possibilidade de registro no Conselho Nacional de Assistencial Social e concessão de Certificado de Entidade Beneficente. O artigo 18, III, da Lei n° 8.742/93 prevê a concessão do CEBAS somente às instituições privadas, in verbis:

Art. 18. Compete ao Conselho Nacional de Assistência Social:

III – observado o disposto em regulamento, estabelecer procedimentos para concessão de registro e certificado de entidade beneficente de assistência social às instituições privadas prestadoras de serviços e assessoramento de assistência social que prestem serviços relacionados com seus objetivos institucionais; (Grifei.)

Tecidas essas considerações, não está a entidade embargante obrigada a preencher o requisito disposto no inciso II do artigo 55 da Lei n° 8.212/91, qual seja, ser portadora do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social.

Neste sentido, sinalizou a 1° Seção desta Corte nos Embargos de Declaração em Embargos de Declaração na Ação Rescisória n° 2006.04.00.007012-0, relatado pelo Desembargador Federal Vilson Darós, julgado em 02/10/2008:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AÇÃO RESCISÓRIA. OMISSÃO. INTEGRAÇÃO. PREQUESTIONAMENTO. EFEITOS INFRINGENTES.

São pré-requisitos autorizadores dos embargos de declaração a omissão, contradição ou obscuridade na decisão embargada. Também a jurisprudência os admite para a correção de erro material e para fim de prequestionamento.

Reconhecida a existência de omissão ou contradição, integra-se o acórdão embargado, acolhendo os embargos de declaração atribuindo-se-lhes efeitos infringentes ao presente julgado para, em juízo rescindendo, julgar improcedente a presente ação rescisória. Foi omisso o julgado em relação a questão que merece análise sob pena de ofensa ao inciso II do art. 535 do CPC. Omisso porque limitou sua fundamentação de procedência da rescisória na falta de registro no Conselho Nacional de Assistência Social e de Certificado de Entidade beneficente, sem perquirir o porquê da não apresentação dos requisitos.

Entidade criada e mantida pelo poder público para atuar na área da seguridade social faz jus ao benefício previsto no inciso §7º do art. 195 da CF/88 independentemente de comprovação dos requisitos previstos no art. 55 da Lei nº 8.212/91.

Vejamos, então, a satisfação dos demais requisitos do artigo 55 da Lei 8.212/91 no caso concreto.

Muito embora seja a Embargante entidade de assistência social, considerada de utilidade pública estadual, não comprovou o preenchimento do requisito do inciso IV do artigo 55 da Lei n.° 8.212/91, (‘IV – não percebam seus diretores, conselheiros, sócios, instituidores ou benfeitores, remuneração e não usufruam vantagens ou benefícios a qualquer título’)

O estatuto da Fundação prevê expressamente, em seu artigo 11, a remuneração dos membros que compõem a Direção-Geral.

Alega a embargante que a Lei n° 6.037/74, o Decreto n° 83.080/79 e o Decreto n° 89.312/84 previram expressamente a isenção da taxa de contribuição de empregador ao Instituto Nacional de Previdência Social relativamente a Febem, nos seguintes termos:

Art. 1º A Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor e as Fundações Estaduais do Bem-Estar do Menor; independentemente de remunerarem seus diretores, são equiparadas as entidades de fins filantrópicos reconhecidas como de utilidade pública, para o fim de serem isentas da taxa de contribuição de empregador ao Instituto Nacional de Previdência Social, nos termos da Lei nº 3.577, de 4 de julho de 1959. (Lei n° 6.037/74)

Art. 70. A Fundação do Bem-Estar do Menor (FUNABEM e as Fundações Estaduais do Bem-Estar do Menor continuam a gozar da isenção prevista na revogada Lei n° 3.577, de 4 de julho de 1959, independentemente do preenchimento dos requisitos do artigo 68. (Regulamento de Custeio de 1979)

Art. 153. A instituição que, reconhecida como de utilidade pública pelo Governo Federal até 1° de setembro de 1977; era portadora de certificado de entidade de fins filantrópicos com validade pro prazo indeterminado, e estava isenta de contribuição empresarial para a previdência social urbana, continua gozando da mesma isenção. (…)

  • 6° A Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (FUNABEM) e as Fundações Estaduais do Bem-Estar do Menor (FEBEM), embora remunerem seus diretores, são equiparadas, para a isenção de que trata este artigo, a entidade de fins filantrópicos reconhecida de utilidade pública. (Decreto n° 89.312/1984)

No entanto, toda e qualquer isenção concedida anteriormente à Constituição Federal de 1988, e não confirmada por lei, foi revogada, nos termos do artigo 41, § 1°, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias:

Art. 41. Os Poderes Executivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios reavaliarão todos os incentivos fiscais de natureza setorial ora em vigor, propondo aos Poderes Legislativos respectivos as medidas cabíveis.

  • 1º – Considerar-se-ão revogados após dois anos, a partir da data da promulgação da Constituição, os incentivos que não forem confirmados por lei.

Salienta-se que os Decretos n.°s 83.080/79 e 89.312/84 foram expressamente revogados pelo Decreto n.° 3.048/99, que não previu qualquer benefício isentivo à Febem ou norma equivalente às revogadas.

Nesse sentido, decidiu esta Turma questão análoga entre as mesmas partes, em julgado do qual fui Relatora:

TRIBUTÁRIO E CONSTITUCIONAL. IMUNIDADE. ENTIDADE FILANTRÓPICA. CONCEITO. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. ART. 195, § 7º, DA CF/88. ART. 55 DA LEI 8.212/91. LEI COMPLEMENTAR VERSUS LEI ORDINÁRIA. PRECEDENTES DO STF. POSIÇÃO CONSOLIDADA NA CORTE ESPECIAL DESTE TRIBUNAL. FUNDAÇÃO PÚBLICA. OBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS NO CASO CONCRETO.

  1. No julgamento da ADI 2028, o STF se posicionou sobre quais são as entidades abrangidas pela imunidade do art. 196, §7º, da CF, afirmando que elas são aquelas beneficentes de assistência social, não estando restrito o preceito, portanto, às instituições filantrópicas. Indispensável, é certo, que se tenha o desenvolvimento da atividade voltada aos hipossuficientes, àqueles que, sem prejuízo do próprio sustento e o da família, não possam se dirigir aos particulares que atuam no ramo buscando lucro, dificultada que está, pela insuficiência de estrutura, a prestação do serviço pelo Estado.
  2. A cláusula inscrita no art. 195, §7º, da Carta Política – não obstante referir-se impropriamente à isenção de contribuição para a Seguridade Social – contemplou com o favor constitucional da imunidade tributária, desde que preenchidos os requisitos fixados em lei. A jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal já identificou, na cláusula inscrita no art. 195, §7º, da Constituição da República, a existência de uma típica garantia de imunidade (e não de simples isenção) estabelecida em favor das entidades beneficentes de assistência social.
  3. Dispondo o referido § 7º do artigo 195 da Constituição Federal sobre limitação constitucional ao poder de tributar, cumpre a sua regulamentação à lei complementar, nos precisos termos do inciso II do artigo 146 da mesma Constituição.
  4. Confirma essa regra o entendimento que compatibiliza o seu enunciado com a possibilidade de veiculação por lei ordinária das exigências específicas para o alcance às entidades beneficentes de assistência social do benefício de dispensa do pagamento de contribuições sociais para a Seguridade Social, na forma do já mencionado § 7º do artigo 195 da Constituição Federal.
  5. Assim, fica reservado o trato a propósito dos limites do benefício de dispensa constitucional do pagamento do tributo, com a definição do seu objeto material, mediante a edição de lei complementar, pertencendo, de outra parte, à lei ordinária o domínio quanto às normas atinentes à constituição e ao funcionamento das entidades beneficiárias do favor constitucional.
  6. Constitucionalidade dos artigos 55 da Lei nº 8.212/91, 5º da Lei n.º 9.429/96, 1º da Lei n.º 9.528/97 e 3º da MP n.º 2.187/01, o primeiro na sua integralidade e os demais nos tópicos em que alteraram a redação daquele, os quais versam sobre os requisitos necessários à fruição do benefício constitucional de dispensa do pagamento de contribuições sociais para a Seguridade Social, contemplado no § 7º do artigo 195 da Constituição Federal em favor das entidades beneficentes de assistência social. Recente jurisprudência do Excelso Supremo Tribunal Federal, bem como da Colenda Corte Especial deste Tribunal (Incidente De Argüição De Inconstitucionalidade na AC Nº 2002.71.00.005645-6/RS, Rel. Des. Federal Dirceu De Almeida Soares, Rel. para acórdão Desª. Federal Marga Inge Barth Tessler, D.E. Publicado em 29/03/2007).
  7. Ainda tomando-se por base a corrente intermediária adotada pelo Egrégio STF e pela Colenda Corte Especial deste Regional, também é possível concluir-se que a necessidade de obtenção e renovação dos certificados de entidade de fins filantrópicos é requisito formal para a constituição e funcionamento das entidades e, portanto, constitui matéria que pode ser tratada por lei ordinária. Precedente desta Turma.
  8. Considerando o caráter público da Fundação, não há possibilidade de registro no Conselho Nacional de Assistencial Social e concessão de Certificado de Entidade Beneficente, nos termos do artigo 18, III, da Lei n° 8.742/93.
  9. Deixando de comprovar os requisitos exigidos em lei, a parte autora não faz jus ao reconhecimento da imunidade pretendida.

(AC nº 2005.71.00.019154-3, decisão unânime, publicada no D.E. de 18.06.2009)

E especificamente em relação à Fundação de Atendimento Sócio-Educativo do Rio Grande do Sul – FASE, também em sede de embargos à execução fiscal nos quais se discutiu a imunidade prevista no art. 195, § 7º, da CF/88, a 2ª Turma deste Regional já reconheceu que a FASE não faz jus a esta imunidade, justamente porque não preenche o inciso VI do artigo 55 da Lei n.° 8.212/91 (‘não percebam seus diretores, conselheiros, sócios, instituidores ou benfeitores, remuneração e não usufruam vantagens ou benefícios a qualquer título’).

Reproduzo a ementa do referido precedente da desta 2ª Turma:

TRIBUTÁRIO E CONSTITUCIONAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. IMUNIDADE. ENTIDADE FILANTRÓPICA. CONCEITO. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. ART. 195, § 7º, DA CF/88. ART. 55 DA LEI 8.212/91. LEI COMPLEMENTAR VERSUS LEI ORDINÁRIA. PRECEDENTES DO STF. POSIÇÃO CONSOLIDADA NA CORTE ESPECIAL DESTE TRIBUNAL. FUNDAÇÃO PÚBLICA. OBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS NO CASO CONCRETO. ENCARGO LEGAL. 1. No julgamento da ADI 2028, o STF se posicionou sobre quais são as entidades abrangidas pela imunidade do art. 196, §7º, da CF, afirmando que elas são aquelas beneficentes de assistência social, não estando restrito o preceito, portanto, às instituições filantrópicas. Indispensável, é certo, que se tenha o desenvolvimento da atividade voltada aos hipossuficientes, àqueles que, sem prejuízo do próprio sustento e o da família, não possam se dirigir aos particulares que atuam no ramo buscando lucro, dificultada que está, pela insuficiência de estrutura, a prestação do serviço pelo Estado. 2. A cláusula inscrita no art. 195, §7º, da Carta Política – não obstante referir-se impropriamente à isenção de contribuição para a Seguridade Social – contemplou com o favor constitucional da imunidade tributária, desde que preenchidos os requisitos fixados em lei. A jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal já identificou, na cláusula inscrita no art. 195, §7º, da Constituição da República, a existência de uma típica garantia de imunidade (e não de simples isenção) estabelecida em favor das entidades beneficentes de assistência social. 3. Dispondo o referido § 7º do artigo 195 da Constituição Federal sobre limitação constitucional ao poder de tributar, cumpre a sua regulamentação à lei complementar, nos precisos termos do inciso II do artigo 146 da mesma Constituição. 4. Confirma essa regra o entendimento que compatibiliza o seu enunciado com a possibilidade de veiculação por lei ordinária das exigências específicas para o alcance às entidades beneficentes de assistência social do benefício de dispensa do pagamento de contribuições sociais para a Seguridade Social, na forma do já mencionado § 7º do artigo 195 da Constituição Federal. 5. Assim, fica reservado o trato a propósito dos limites do benefício de dispensa constitucional do pagamento do tributo, com a definição do seu objeto material, mediante a edição de lei complementar, pertencendo, de outra parte, à lei ordinária o domínio quanto às normas atinentes à constituição e ao funcionamento das entidades beneficiárias do favor constitucional. 6. Constitucionalidade dos artigos 55 da Lei nº 8.212/91, 5º da Lei n.º 9.429/96, 1º da Lei n.º 9.528/97 e 3º da MP n.º 2.187/01, o primeiro na sua integralidade e os demais nos tópicos em que alteraram a redação daquele, os quais versam sobre os requisitos necessários à fruição do benefício constitucional de dispensa do pagamento de contribuições sociais para a Seguridade Social, contemplado no § 7º do artigo 195 da Constituição Federal em favor das entidades beneficentes de assistência social. Recente jurisprudência do Excelso Supremo Tribunal Federal, bem como da Colenda Corte Especial deste Tribunal (Incidente De Argüição De Inconstitucionalidade na AC Nº 2002.71.00.005645-6/RS, Rel. Des. Federal Dirceu De Almeida Soares, Rel. para acórdão Desª. Federal Marga Inge Barth Tessler, D.E. Publicado em 29/03/2007). 7. Ainda tomando-se por base a corrente intermediária adotada pelo Egrégio STF e pela Colenda Corte Especial deste Regional, também é possível concluir-se que a necessidade de obtenção e renovação dos certificados de entidade de fins filantrópicos é requisito formal para a constituição e funcionamento das entidades e, portanto, constitui matéria que pode ser tratada por lei ordinária. Precedente desta Turma. 8. Considerando o caráter público da Fundação, não há possibilidade de registro no Conselho Nacional de Assistencial Social e concessão de Certificado de Entidade Beneficente, nos termos do artigo 18, III, da Lei n° 8.742/93. 9. Deixando de comprovar os requisitos exigidos em lei, a parte autora não faz jus ao reconhecimento da imunidade pretendida. 10. A Corte Especial deste Tribunal reconheceu a constitucionalidade do encargo legal de 20% previsto no Decreto-Lei nº 1.025/69, na sessão realizada em 24.09.2009, rejeitando a Arguição de Inconstitucionalidade na AC nº 2004.70.08.001295-0/PR. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5003872-77.2010.404.7100, 2a. Turma, LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH, sessão de 08/05/2012)

Assim, deve ser integralmente rejeitados os presentes embargos à execução fiscal, reformando-se a sentença de primeira instância.

6) Encargo Legal

A Corte Especial deste Tribunal reconheceu a constitucionalidade do encargo legal de 20% previsto no Decreto-Lei nº 1.025/69, na sessão realizada em 24.09.2009, rejeitando a Arguição de Inconstitucionalidade na AC nº 2004.70.08.001295-0/PR, da relatoria do Desembargador Federal Otávio Roberto Pamplona.

Resta, assim, mantido também o encargo legal incluído no executivo embargado.

7) Honorários de Sucumbência

A União sustenta em sua apelação que foi sucumbente minimamente no feito, pois restou mantida integralmente a execução. Argumenta que ‘não há mais pretensão resistida na medida em que havendo questionamento judicial de ente público por meio de embargos, o entendimento da União é que é devido a expedição de certidão, o mesmo acontecendo em relação ao CADIN, motivo pelo não recorre a União desses pontos, não se justificando condenação em honorários nesse ponto também’.

Assiste razão à União, pois, conforme anteriormente decido, a execução embargada tinha por objetivo cobrar a importância de R$ 27.697.466,72, cobrança esta que restou mantida integralmente.

Portanto afasto a condenação da União em honorários advocatícios.

8) Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da União, para rejeitar integralmente os embargos à execução fiscal, e julgar prejudicada a apelação da embargante.

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