Jurisprudência
24 abr 14 00:00

EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – ENTIDADE RECONHECIDAMENTE DE FINS FILANTRÓPICOS – ISENÇÃO/IMUNIDADE DA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA – CERTIFICADO DE FILANTROPIA (CEBAS)

O STF já afirmou que a simples ausência de certificado, por si só, não é obstáculo para o gozo da isenção, entendimento esse seguido pelo STJ, no sentido de que o certificado que reconhece a entidade como filantrópica, de utilidade pública, tem efeito ex tunc – por se tratar de ato declaratório -, o direito à isenção, tanto mais quando a entidade possui o certificado filantrópico, não pode ser tolido ante o singelo argumento de que a entidade não teria comunicado ao Fisco seu status.

Demonstrada pela executada ser entidade filantrópica, com apresentação de CEBAS válido por todo o período cobrado; e o fato de o Fisco se apegar só na singela afirmativa de que a empresa não lhe teria comunicado a obtenção do certificado filantrópico, reconhecer a isenção é medida que se impõe, ante a desproporcionalidade resultante da conseqüência do não reconhecimento dessa atividade.

RELATOR                 :     DESEMBARGADOR FEDERAL LUCIANO TOLENTINO AMARAL

APELANTE              :     FAZENDA NACIONAL

PROCURADOR      :     CRISTINA LUISA HEDLER

APELADO                :     ABRIGO DO SALVADOR E OUTROS(AS)

ADVOGADO          :     MARCOS JORGE CALDAS PEREIRA E OUTROS(AS)

RELATÓRIO

EXMO. SR.DESEMBARGADOR FEDERAL LUCIANO TOLENTINO AMARAL (RELATOR):

A FN (f. 215/34) apela da sentença (f. 204/11) que extinguiu sua EF (CPC, art. 267, IV c/c art. 618) cobrando contribuição previdenciária, no período de JAN/1995 a JUN/2005, no valor de, à época, R$ 9.737.271,45.

Em 26 OUT 2009 (f. 85/92), Abrigo do Salvador apresentou exceção de pré-executividade, alegando decadência dos créditos a DEZ/2000, pois decorridos mais de cinco anos entre o primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ele poderia ter sido lançado e sua constituição, em DEZ/2005; e que é entidade filantrópica que preenche todos os requisitos para gozar da imunidade do art. 195, §7º, da CF/88.

Houve concordância da FN com a decadência. Insiste na legitimidade da exação do período posterior à decadência, contudo, porque a executada não comprovou preencher todos os requisitos para gozo da imunidade, em especial a obrigação do 1º do art. 55 da Lei n.º 8.212/1991 (“Ressalvados os direitos adquiridos, a isenção de que trata este artigo será requerida ao Instituto Nacional do Seguro Social-INSS, que terá o prazo de 30 (trinta) dias para despachar o pedido.”)

S. Exa. extinguiu os créditos anteriores a DEZ/2000, por decadentes (f. 160); e deixou de aplicar o art. 55 da Lei n. 8.212/1991, porque o STF, quando do julgamento da ADin n.º 2028, reconheceu que imunidade deve ser exclusivamente regulamentada por lei complementar. Assim, preenchidos os requisitos do art. 14 do CTN, a executada fazia jus à imunidade durante o período da cobrança, pois tem CEBAS desde 1997.  Condenou a FN em honorários advocatícios de 5% sobre o valor da execução.

A apelante insiste na não comprovação dos requisitos para a fruição da imunidade; validade do art. 55 da Lei n.º 8.212/91 para disciplinar a matéria; a Constituição não expressa que a imunidade de seu art. 195 exigiria lei complementar para fins de regulamentação; inaplicabilidade dos artigos 9º e 14 do CTN, pois tratam de impostos, não contribuições. Pede a redução dos honorários advocatícios.

Com contrarrazões (f. 243/6), pugnando pela manutenção da sentença.

Autos recebidos no gabinete em 20 NOV 2012.

É o relatório.

VOTO

Sentença proferida contra a União, em que discutida questão cujo valor da controvérsia supera os 60 salários mínimos enseja a obrigatoriedade da remessa oficial, que tenho por interposta.

Confirma-se a bem construída e fundamentada sentença, mais, notadamente, porque escudada em detida análise dos documentos juntados aos autos, fazendo as devidas correlações entre as datas de concessão dos diversos Certificados de Entidade de Fins Filantrópicos e as datas dos débitos originários da NFLD em questão.

Eis a sentença, cujos fundamentos integram este julgado:

“……………………………………………………………………………………………………………

Com efeito, a mera ausência de requerimento formal perante o INSS não tem o condão de descaracterizar a imunidade assegurada nos termos do art. 195, §7º, da CF c/c art. 14 do CRN, máxime porque, no caso concreto, resta incontroverso o fato de que, durante todo o período do débito exequendo (competências 12/2000 a 06/2005), a Executada já possuía o Registro de Entidade de Fins Filantrópicos, fornecido pelo Conselho Nacional de Assistência Social, em conformidade com o inc. II do art. 55 da Lei n.º 8.212/1991 (vide fls. 124/126).

……………………………………………………………………………………………………….”

A executada, portanto, demonstrou ser reconhecida como entidade filantrópica desde 1997 (f. 124/7). Tem, portanto, garantida a manutenção de sua isenção:

MANDADO DE SEGURANÇA. AGRAVO REGIMENTAL. TRIBUTÁRIO. FILANTROPIA. RENOVAÇÃO DE CERTIFICADO DE ENTIDADE BENEFICENTE. LEI nº 3.577/59. DIREITO ADQUIRIDO.

1. Entidade filantrópica constituída antes do Decreto-Lei nº 1.577/77 tem direito à manutenção da imunidade tributária prevista no art. 195, § 7º da Constituição Federal sob a condição de preencher os requisitos estatuídos na Lei nº 3.577/59.

2. O art. 55, § 1º, da Lei nº 8.212/91 ressalva o direito adquirido das entidades previamente constituídas.

3. O Decreto nº 752/93 não pode retroagir seus efeitos quanto às entidades supra- referidas.

4. Constatado o direito à imunidade, há que ser visualizado o direito à renovação do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social – CEBAS.

 (STJ, MS 9.220/DF, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/03/2004, DJ 07/06/2004, p. 152)

Ora, se o STF já afirmou que a simples ausência de certificado, por si só, não é obstáculo para o gozo da isenção, entendimento esse seguido pelo STJ, no sentido de que o certificado que reconhece a entidade como filantrópica, de utilidade pública, tem efeito ex tunc – por se tratar de ato declaratório –, o direito à isenção, tanto mais quando a entidade possui o certificado filantrópico, não pode ser tolido ante o singelo argumento de que a entidade não teria comunicado ao Fisco seu status:

“(…) TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. CERTIFICADO DE FILANTROPIA. CEBAS. REQUISITOS. (…).

(…) Ademais, o certificado tem eficácia imanentemente declaratória de uma dada situação fática e sua ausência, tão-somente por si, não é obstáculo intransponível ao gozo do direito constitucional. Portanto, a denegação da segurança para emissão compulsória do CEBAS não afasta, singelamente, o exame do atendimento dos requisitos para gozo da imunidade tributária, a tempo e modo próprios. Agravo regimental ao qual se nega provimento.

(STF, RE 472475 ED, Rel.:  Min. JOAQUIM BARBOSA, T2, DJe PUBLIC 19-09-2012)

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 “TRIBUTÁRIO. ENTIDADE FILANTRÓPICA. IMUNIDADE. CERTIFICADO. NATUREZA DECLARATÓRIA DO ATO. EFEITOS EX TUNC. CRÉDITOS PRETÉRITOS. INEXIGIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83/STJ.

1. O STJ consolidou seu entendimento no sentido de que o certificado que reconhece a entidade como filantrópica, de utilidade pública, tem efeito ex tunc, por se tratar de ato declaratório, consoante orientação consagrada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário n. 115.510/RJ.

2. O ato declaratório da concessão de isenção tem efeito retroativo à data em que a pessoa reunia os pressupostos legais para o reconhecimento dessa qualidade.”

(AgRg no AREsp 291799/RJ, T2, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, DJe 01.08.2013)

“TRIBUTÁRIO. CERTIFICADO DE ENTIDADE DE FINS FILANTRÓPICOS. ART. 55 DA LEI 8.212/1991. ATO DECLARATÓRIO. EFEITO EX TUNC. TERMO INICIAL. DATA DO REQUERIMENTO.

1. A jurisprudência do STJ, alinhada à orientação do STF, firmou-se no sentido de que o Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos tem cunho declaratório e possui efeito retroativo à data de seu requerimento.

2. Agravo Regimental não provido.”

(STJ, AgRg no AREsp 12.264/PR, T2, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 09/09/2011.)

O CPC (art. 20, “caput”, e §4º) determina que os honorários advocatícios devidos ao vencedor “serão fixados consoante apreciação equitativa do juiz atendidas as normas das letras “a” a “c” do” §3º ([a] o grau de zelo do profissional; [b] o lugar de prestação do serviço; e [c] a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço).

Nesse contexto, ante a responsabilidade inerente aos patronos da executada ao patrocinar causa de tão vultoso valor (cerca de R$ 10 milhões), bem como o trabalho por eles despendido; a insistência da FN em contestar o direito já reconhecido pela jurisprudência de todos os tribunais; e a importância que a causa tem, dada a natureza da executada (entidade de assistência social voltada aos idosos) atender ao apelo da FN feriria as normativas da espécie, a não prover de razoabilidade sua irresignação.

Pelo exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação e à remessa oficial, tida por iterposta..

É como voto.

DESEMBARGADOR FEDERAL LUCIANO TOLENTINO AMARAL

RELATOR

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