
Decreto federal de educação inclusiva provoca reação de entidades e acende debate sobre papel das escolas especializadas
A publicação do Decreto 12.686/2025, que institui a Política Nacional de Educação Especial Inclusiva, desencadeou críticas de entidades que atendem estudantes com deficiência e reabriu o debate sobre a coexistência entre a rede regular de ensino e as escolas especializadas. A Apae Brasil repudiou a medida e declarou apoio ao Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 845/2025, apresentado pelo senador Flávio Arns (PSB), que busca sustar os efeitos do decreto. O governo federal nega retrocessos e afirma que a política visa assegurar educação sem capacitismo e com igualdade de oportunidades.
O que diz o decreto
- Define diretrizes para a inclusão de estudantes da educação especial na rede regular, com foco na universalização das matrículas em escolas de ensino comum.
- Mantém o Atendimento Educacional Especializado (AEE), a ser ofertado preferencialmente em escolas comuns e, de forma complementar, em centros especializados conveniados.
- Cria a Rede Nacional de Educação Especial Inclusiva, responsável por monitoramento, formação de profissionais e repasse de recursos.
- Torna obrigatório o Plano de Atendimento Educacional Especializado (PAEE) para orientar o trabalho pedagógico nas escolas.
- Prevê formação mínima de 80 horas para apoiadores e dispensa a exigência de laudo médico para acesso ao atendimento especializado.
- Determina que o AEE ocorra no contraturno, diferentemente do atendimento integrado às rotinas de escolas dedicadas exclusivamente a esse público.
As críticas das entidades
- A Apae Brasil sustenta que a política pode prejudicar estudantes com deficiência intelectual, múltipla e TEA atendidos hoje em escolas especializadas, ao transformar a prioridade pela rede comum em uma obrigação de fato.
- A entidade defende a coexistência entre classes comuns e escolas especializadas, argumentando que uniformizar por decreto um único caminho tende a excluir quem mais necessita de suporte intensivo.
- A associação afirma que mais de 112 mil estudantes dependem desses serviços no país e alerta que a continuidade de instituições sem fins lucrativos pode ser restringida.
- Há o entendimento, entre entidades e especialistas, de que o texto pode afrontar garantias da Constituição e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), especialmente quanto ao caráter “preferencial” — e não compulsório — da inclusão em classes comuns.
Posição do governo
- O Executivo afirma que não há retrocesso e que a proposta busca consolidar um sistema educacional inclusivo, fortalecendo mecanismos de monitoramento, garantindo acessibilidade e apoiando docentes e estudantes.
- O Ministério da Educação coordenará a política e sustenta que o AEE continuará existindo, sendo preferencialmente ofertado em escolas comuns e de modo complementar em centros especializados conveniados.
- O governo informou que a regulamentação detalhará procedimentos e que está aberto a receber sugestões de ajustes das entidades representativas.
Pontos sensíveis em debate
- Risco de esvaziamento de escolas especializadas: entidades alertam que a universalização das matrículas na rede regular, aliada ao AEE apenas no contraturno, pode reduzir a demanda e comprometer a sustentabilidade de instituições especializadas que atendem casos de maior complexidade.
- Formação de profissionais: a carga mínima de 80 horas prevista para apoiadores é vista como insuficiente por especialistas, frente às demandas de estudantes que requerem suporte pedagógico e de acessibilidade mais intensivo.
- Marco legal: persiste a discussão sobre compatibilidade entre o decreto e a LDB, especialmente no que toca à garantia da escolha da família e à manutenção de redes e serviços especializados como parte do sistema.
- Acesso ao atendimento: a dispensa de laudo médico é apontada por alguns como facilitadora do acesso, enquanto outros temem critérios de elegibilidade difusos sem parâmetros técnicos claros.
No Congresso e próximos passos
- O PDL 845/2025, de autoria do senador Flávio Arns, busca sustar o decreto e deve pautar o debate legislativo sobre os limites de uma política nacional por ato do Executivo em matéria sensível da educação.
- O Ministério da Educação afirma que o texto passará por regulamentação, etapa em que diretrizes poderão ser detalhadas, inclusive quanto à integração entre redes, financiamento, responsabilidades federativas e padrões de qualidade do AEE.
- Entidades especializadas e redes de ensino sinalizam que continuarão a apresentar propostas de aprimoramento, com foco na coexistência entre classes comuns e escolas especializadas e na garantia de atendimento adequado aos estudantes que necessitam de suporte intensivo.
O que está em jogo
O ponto central da controvérsia é como garantir inclusão com qualidade: de um lado, a prioridade da rede regular como eixo do sistema educacional inclusivo; de outro, a necessidade de preservar e fortalecer a atuação de escolas e serviços especializados para estudantes que demandam acompanhamento contínuo, tecnologia assistiva e equipes multidisciplinares. A definição dos mecanismos de financiamento, formação docente, parâmetros de atendimento e monitoramento de resultados será determinante para que a política assegure, na prática, o direito à educação com igualdade de oportunidades — sem excluir serviços que hoje são essenciais para uma parcela significativa de estudantes.
Resumo:
- Decreto 12.686/2025 institui política nacional de educação especial inclusiva, com AEE preferencialmente na rede comum e criação de uma rede nacional de apoio.
- Apae Brasil e outras entidades veem risco de esvaziamento das escolas especializadas e apontam possíveis conflitos com a LDB.
- Governo nega retrocessos, sustenta manutenção do AEE e promete regulamentação detalhada.
- PDL 845/2025 no Senado tenta sustar o decreto; debate legislativo e técnico deve se intensificar nas próximas semanas.
Fonte: Comunicação IBEE, acesso em 27/10/2025
COMISSÃO DEBATE OFERTA DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA EM CLASSE ESPECIAL OU COMUM