Jurisprudência
30 jan 19 14:35

EDUCAÇÃO DEVER CONSTITUCIONAL DO ESTADO E DA FAMÍLIA

Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro

Quarta Câmara Cível

Remessa Necessária nº. 0005535-04.2016.8.19.0014

Autor: SOPHIA JULIA DA SILVA CORDEIRO, representada por sua mãe

Vanessa Soares da Silva de Souza

Réu: MUNICÍPIO DE CAMPOS DOS GOYTACAZES

Relator: DES. Antônio Iloízio Barros Bastos

APELAÇÃO CÍVEL. REMESSA NECESSÁRIA. VAGA EM CRECHE. MUNICÍPIO DE CAMPOS DOS GOYTACAZES. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. SENTENÇA CONFIRMADA EM SEDE DE REMESSA NECESSÁRIA.

1- O direito à educação é essencial ao desenvolvimento do menor, se afigurando um direito subjetivo da criança, competindo ao poder público garantir sua efetivação.

2- Dever constitucional imposto pelos artigos 205, 208, e 211, § 2º, da Constituição Federal.

3- Situação reafirmada no Estatuto da criança e do adolescente que, no seu art. 54, IV, assegurado atendimento em creche e pré-escola.

4- No mesmo sentido, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (nº 9.394/96) prevê em seu art. 4º, IV, que o dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de idade.

5- Sentença que se confirma em sede de remessa necessária.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de remessa necessária no processo nº. 0005535-04.2018.8.19.0014, onde é autor SOPHIA JULIA DA ISLVA CORDEIRO, representada por sua mãe Vanessa Soares da Silva de Souza, e réu MUNICÍPIO DE CAMPOS DOS GOYTACAZES

ACORDAM os integrantes desta Quarta Câmara Cível, em sessão realizada nesta data e por unanimidade de votos em confirmar a sentença em sede de remessa necessária, nos termos do voto do Relator.

Integra o relatório já apresentado nos autos, in verbis:

Trata-se de remessa necessária da sentença às fls. 49/51 (peça eletrônica 058), que julgou procedente o pedido inicial, tornando definitiva a tutela concedida, para determinar que o Município de Campos dos Goytacazes mantenha SOPHIA JULIA DA SILVA CORDEIRO matriculada em escola/creche próxima a sua residência.

Parecer da Douta Procuradoria de Justiça às fls. 80/89 (peça eletrônica 080) pela confirmação da sentença em remessa necessária.

Passo ao Voto.

Estabelece o art. 227 da CF que:

“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”

A mesma Constituição, em seu artigo 205, prescreve que a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Ainda, o seu art. 208, incisos I e IV, estabelece que:

Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:

I – Educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria;

IV – Educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade;

No mesmo sentido o Estatuto da Criança e do Adolescente, que em seu art. 54, IV, dispõe que é dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente o atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade.

Temos, ainda, a corroborar tal entendimento, a Lei de Diretrizes e Bases da Educacao Nacional, Lei 9.394/96, que em seu art. 4º, prevê que o dever do Estado com a educação  será efetivado mediante a garantia de atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de idade.

Já o art. 11, V, do mesmo dispositivo legal, dispõe que os Municípios incumbir-se-ão de oferecer a educação infantil em creches e préescolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino.

Ressalte-se que o direito à matrícula em creche e pré-escola é direito público subjetivo da criança e se enquadra no conceito de “ensino obrigatório”, cujo não oferecimento pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente, segundo dicção dos §§ 1º e 2º do art. 208 da Constituição.

Além disso, o legislador constitucional atribuiu ao Município a atuação prioritária no ensino fundamental e na educação infantil (art. 211, § 2º da Constituição).

Na verdade, a política de aproximação aluno-escola justifica-se em um País onde os menos favorecidos não têm sequer acesso ao transporte coletivo satisfatório, necessário ao deslocamento daqueles que precisam e querem apreender.

Daí, e em atenção aos princípios da proteção integral e do melhor interesse da criança, é de ser mantida a sentença que, ao julgar procedente o pedido, reconheceu o direito à matricula em creche municipal próxima a sua residência.

Nesse sentido os julgados que ora se colaciona:

REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. CRECHE. DIREITO À EDUCAÇÃO. Recusa de vaga em creche, configurando ato ilegal da autoridade pública municipal. Doutrina da Proteção Integral. Prioridade absoluta. Astreintes corretamente arbitradas. Recurso desprovido.

0001372-34.2016.8.19.0061 – REMESSA NECESSARIA Des (a). HENRIQUE CARLOS DE ANDRADE FIGUEIRA – Julgamento: 31/01/2017 – QUINTA CÂMARA CÍVEL ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO CONSTITUCIONAL À EDUCAÇÃO. MATRÍCULA EM CRECHE MUNICIPAL. Mandado de segurança destinado a matricular a Impetrante em creche municipal, recusada pela Impetrada ao argumento de faltar vagas na rede pública. Nos termos dos artigos 205, 208, IV e 227 da Constituição Federal é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança o direito à educação, sendo que o artigo 211, § 2º da Constituição Federal estabelece como prioridade dos Municípios a educação infantil. Em sede infraconstitucional o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação renovam a obrigação. A exclusão promovida pelo Impetrado por deixar de oferecer vagas de ensino na rede pública consubstancia desigualdade de tratamento onde é de todo impossível haver qualquer resíduo de diferenciação, uma vez que a norma constitucional garante a igualdade entre as pessoas, e o poder público não pode sob qualquer pretexto deixar de cumprir o comando constitucional, mas a ele se adaptar. Se porventura faltam creches ou escolas, o Município deve se organizar melhor a fim de cumprir sua missão constitucional de relevante importância. O conjunto de normas legais e constitucionais prevê o dever de o poder público dotar a infância e a adolescência de ensino, o que em contrapartida faz surgir o direito destes em receber o serviço público de educação. Orientação jurisprudencial do E. Superior Tribunal de Justiça. Desobedecer aos comandos constitucional e legal importa em colocar os menores à margem da lei, e impede a indispensável, regular e efetiva inclusão social pelo veto ao conhecimento e àeduação, certo que não existe discricionariedade para o administrador público escolher quem frequentará a sala de aula. Confirmação da sentença.

Diante do exposto, voto no sentido de confirmar a sentença em sede de remessa necessária.

Rio de Janeiro, 30 de janeiro de 2019.

Antônio Iloízio Barros Bastos

DESEMBARGADOR

Relator

 

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