Jurisprudência
22 ago 15 11:15

ESTADO ALEGA QUE NÃO PODE ATENDER ALUNO ESPECIAL (PORTADOR DE NECESSIDADE) POR NÃO TER VAGA, ESPAÇO FÍSICO E PROFISSIONAIS

DECISÃO GARANTE MUDANÇA DE TURNO ESCOLAR A ALUNO ESPECIAL

A 4ª Turma Cível do TJDFT deu provimento a recurso de aluno especial a fim de garantir-lhe a mudança de turno escolar na rede pública de ensino, onde encontra-se matriculado, diante de laudo médico que demonstra tal necessidade. A decisão foi unânime.

O autor alega que necessita de vaga no turno matutino da rede pública de ensino, por recomendação médica, conforme relatórios juntados aos autos. Sustenta que tem necessidades especiais e que a mudança de turno é essencial para que possa ter aproveitamento dos estudos, dada a medicação de que faz uso. Assim, pede a antecipação da tutela para que o DF proceda a mudança pleiteada.

Em contrarrazões, o DF alega que o atendimento do pleito do aluno compromete as respectivas acomodações e aprendizado do centro educacional, tendo em vista que não se fabricam vagas, espaço físico e profissionais com a especialização requerida para trabalhar com menores portadores de necessidades especiais, pelo que o caso se submete ao princípio da reserva do possível.

O relator, a seu turno, afirma que o direito à educação não pode ser postergado devido a contingências orçamentárias, dificuldades administrativas ou escala de priorização das políticas públicas. Ele ressalta que os laudos médicos demonstram que o aluno tem retardo mental leve e alteração do processamento auditivo central, além de cefaleia que se intensifica no período da tarde, sendo certo que os medicamentos usados provocam sonolência que pode comprometer o seu aprendizado.

Ainda segundo o desembargador, as alegações do autor são verossímeis, na medida em que a recusa de transferência para o turno matutino “prejudica seriamente o seu aprendizado e, por conseguinte, afeta a plenitude do exercício do direito à educação assegurado na Lei Maior”.

Diante disso, o Colegiado deu provimento ao recurso para conceder a tutela antecipada, permitindo que o aluno frequente as aulas no período matutino no mesmo centro de ensino, sob pena de violação ao princípio da proteção integral à criança e ao adolescente consagrado em nível constitucional.

 




 

Órgão  :  4ª TURMA CÍVEL

Classe  :  AGRAVO DE INSTRUMENTO

  1. Processo : 20150020080260AGI

(0008115-19.2015.8.07.0000)

Agravante(s)  :  WILLIAM DE PAULA FREITAS

Agravado(s)  :  DISTRITO FEDERAL

Relator  :  Desembargador JAMES EDUARDO OLIVEIRA

Acórdão N.  :  879154

E M E N T A

DIREITO CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO  DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. DIREITO À EDUCAÇÃO.  ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA JURISDICIONAL.  DISCENTE PORTADOR DE RETARDO MENTAL LEVE E  ALTERAÇÃO DO PROCESSO AUDITIVO. NECESSIDADE DE  MUDANÇA DE TURNO AMPARADA EM LAUDO MÉDICO.  REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS.

  1. O direito à educação não pode ser postergado devido a contingências orçamentárias, a dificuldades administrativas ou à escala de priorização das políticas públicas.
  2. À vista de prescrição médica que recomenda a mudança de turno escolar de aluno portador de condição de saúde especial e face aos indicativos de que a sua permanência no turno  vespertino prejudica seriamente o seu aprendizado, atingindo a  plenitude do exercício do direito à educação assegurado na Lei  Maior, reputam-se presentes os requisitos que legitimam a  antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional.

III. Recurso conhecido e provido.

A C Ó R D Ã O

Acordam os Senhores Desembargadores da 4ª TURMA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, JAMES EDUARDO OLIVEIRA

-Relator, FERNANDO HABIBE – 1º Vogal, ARNOLDO CAMANHO – 2º Vogal, sob a presidência do Senhor Desembargador ARNOLDO CAMANHO, em proferir a seguinte decisão: DAR PROVIMENTO AO RECURSO, UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.

Brasilia(DF), 17 de Junho de 2015.

Documento Assinado Eletronicamente

JAMES EDUARDO OLIVEIRA

Relator

R E L A T Ó R I O

Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO interposto por WILLIAM DE PAULA FREITAS, representado por sua genitora Maria Célia Paula de Freitas, contra a decisão proferida pelo Juízo da 4ª Vara da Fazenda Pública do Distrito Federal que, na AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER ajuizada em desfavor do DISTRITO FEDERAL, indeferiu o pedido de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional.

Alega o Agravante que necessita de vaga no turno matutino da rede publica de ensino, por recomendação médica, conforme relatórios que instruem a petição inicial.

Sustenta que tem necessidades especiais e que a mudança de turno é essencial para que possa ter aproveitamento dos estudos, dada a medicação de que faz uso.

Pede a antecipação da tutela recursal para que o Agravado proceda à sua transferência para o turno matutino no mesmo centro de ensino, e, ao final, a confirmação da liminar.

Parte isenta do recolhimento do preparo, por ser beneficiária da justiça gratuita (fl. 22).

A antecipação dos efeitos da tutela recursal foi deferida nos termos da decisão de fls. 26/29.

Em contrarrazões, o Agravado alega que o atendimento do pleito do Agravante compromete as respectivas acomodações e aprendizado do centro educacional, tendo em vista que não se fabricam vagas, espaço físico e profissionais com a especialização requerida para trabalhar com menores portadores de necessidades especiais, pelo que o caso se submete ao princípio da reserva do possível.

Aduz ainda que a concessão da liminar não pode subsistir, ao menos até que estudo psicossocial seja feito a indicar a real necessidade da vaga no turno solicitado pelo Recorrente, porquanto não há prova inequívoca da necessidade da alteração de turno.

Parecer do Ministério Público (fls. 42/43) pelo conhecimento e provimento do recurso.

V O T O S

O Senhor Desembargador JAMES EDUARDO OLIVEIRA – Relator

Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do agravo de instrumento. O artigo 208, inciso IV, da Constituição Federal, emprestando maior concretude ao direito social à educação consagrado em seu artigo 6º, prescreve:

Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:

I – educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria;

(…)

Na esteira dessa diretriz constitucional, estatui o artigo 221 da Lei Orgânica do Distrito Federal:

Art. 221. A Educação, direito de todos, dever do Estado e da família, nos termos da Constituição Federal, fundada nos ideais democráticos de liberdade, igualdade, respeito aos direitos humanos e valorização da vida, deve ser promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, tem por fim a formação integral da pessoa humana, a sua preparação para o exercício consciente da cidadania e a sua qualificação para o trabalho e é ministrada com base nos seguintes princípios:

(…)

  • 1º A educação básica pública é obrigatória e gratuita dos 4 aos 17 anos de idade, assegurada inclusive a sua oferta para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria.

Reside, então, na Lei Maior e na lei ordinária que a regulamenta, bem como na própria Lei Orgânica do Distrito Federal, o dever do Distrito Federal de garantir a todos que preencham os requisitos etários e legais acesso a todas as etapas da educação básica.

No caso sub judice, o Agravante conta com dezesseis anos de idade e está matriculado no 7º ano, período vespertino (fl. 14), porém há recomendação médica de que seja transferido para o turno matutino.

Como demonstram os laudos médicos de fls. 15, 16 e 18, o Agravante tem Retardo Mental Leve (CID F70) e Alteração do Processamento Auditivo Central. Além disso, apresenta quadro de cefaléia que se intensifica no período da tarde e os medicamentos usados provocam sonolência que pode comprometer o seu aprendizado.

Vê-se, assim, que as alegações são verossímeis (fumus boni iuris), na medida em que a recusa de transferência do Agravante para o turno matutino prejudica seriamente o seu aprendizado e, por conseguinte, afeta a plenitude do exercício do direito à educação assegurado na Lei Maior.

O risco de dano irreparável ou de difícil reparação (periculum in mora) também se apresenta com a indispensável clareza e atualidade, pois a negativa da antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional viola o princípio da proteção integral à criança e ao adolescente consagrado em nível constitucional.

Forte nessas razões, conheço e dou provimento ao recurso para conceder a tutela antecipada, nos termos da liminar deferida.

O Senhor Desembargador FERNANDO HABIBE – Vogal

Com o relator.

O Senhor Desembargador ARNOLDO CAMANHO – Vogal

Com o relator.

D E C I S Ã O

DAR PROVIMENTO AO RECURSO, UNÂNIME

 

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